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sexta-feira, 11 de julho de 2008

Kubrick, bosta e vomito

Estou com sono e estou amando. Vai um remedinho? Alice é o nome da cadela. Sobrenome Groves. Alice Groves. Parece nome de transformista bissexual de anúncio de jornal. Por isso é só Alice. Conheci-a numa festa de roqueiros, hippies pós-modernos e cangaceiros ultra-vanguardistas. Um destemperado acaso bem no meio da madrugada. Cicuta vai, cicuta vem, maconha cá, maconha lá, e o meu parceiro Dedinho Joplin me chama para um canto melecado de bosta e vomito e me apresenta Alice. Dois beijinhos, Oi, como vai, Vou bem, E você, Ótima, ahhh! Então ta tudo em cima, Ô se não!

Sentamos em um sofá de espuma também melecado de bosta e vomito, tudo naquela maldita festa parecia melecado de bosta e vomito. Por um momento tive a impressão que Alice também fedia à bosta e vomito. Não entranhei, a maioria das garotas que conheço também fedem a bosta e vomito.

Duas horas depois do segundo baseado, Alice põe suas mãos aveludadas sobre minhas pernas magras e diz, Olha, andré, isso tava escrito, Não, Alice, não tava, Tava, andrézinho, posso te chamar de andrézinho, É claro, todo mundo pergunta se pode me chamar de andrézinho, E você, deixa que te chamem assim, Nem sempre, uma vez um viado perguntou se podia me chamar de andrézinho... você sabe, né? viado é viado, tudo safado, Eu sei, andrézinho.

Alice é vidrada em tarô, carteado, reencarnação, pomba gira e batizado. Alice tem dezenas de sonhos. Sabe, andré, tenho dezenas de sonho, foi a terceira frase que Alice me disse. A primeira e a segunda eu não lembro. Nunca se leva uma mulher suficientemente a sério para considerar suas duas primeiras frases.

Alice não toma Álcool. É uma pena. Fuma maconha, já experimentou êxtase, mas, cachaça, nana-nina-não. Titio morreu de cirrose e eu procuro evitar, sabe como é, né, andrezinho, Meu avô morreu em um cabaré e nem por isso eu deixo de freqüentá-los, Você não entende, não tem coração, seu coração está nos bagos.

Alice não sabe nada sobre mim, nunca soube. Mas é bem possível que eu queira uma mulher assim, como Alice. Alice é meu tormento e meu principal tema. Noventa e nove % dessa bobalhada que escrevo têm origem em Alice e em seus olhos de ameixas murchas dentro de uma lata de conserva. Mesmo quando escrevo sobre Panquecas ou sobre Uísque dezoito anos, é em Alice que estou pensando. Tudo me remete a Alice. Qualquer gozo meu é dentro do buraco estreito de Alice, não importa qual buraco seja. Toda ofensa que disparo é contra Alice, não importa contra quem. Preciso urgentemente de Alice. Preciso surrá-la. Preciso mantê-la em cativeiro, pão, água, duas punhetas diárias e três beijos molhados, Antes, Durante e Depois do pôr-do-sol. O ápice do amor dá-se durante o espancamento. Nunca surrei Alice. Talvez seja isso o que falta em nossa santa-sagrada-ecumênica-afinidade entre dois putos apaixonados. Alice é o bueiro onde sempre sonhei malocar meu rato peludo e malcheiroso. Tragam-me Alice, viva ou morta, não interessa, tenho um freezer enorme nos fundos de casa. Alice é o tipo de mulher que empina mais o nariz do que a bunda, o tipo de puta que suporta mais que três semanas sem duas trepas distintas.

Certa vez ela me convidou para assistir laranja mecânica em sua casa. Papai e mamãe tinham ido fazer comprinhas e Alice tava afim de kubrick e uma bronha.

- esses caras dão pro gasto.
- é verdade, são uns putos de uns filhos da puta!
- não, não é. glauber rocha, gordard? tem coisa melhor.
- ah! larga de bancar o intelectual, andrezinho. glauber ou gordard seriam incapazes de produzir um tapão na cara... imagina essa zorra toda.
- deixa de titití, doidinha. antes antonio das mortes a esses retardados de uma ova.
- preciso de maconha em pílulas. meus pulmões estão cheios de catarro.
- quem mandou levar chuva às duas e meia da madruga?
- levei chuva porque você é um fudido e não têm carro.
- cala essa boca. se eu tivesse carro eu pegava coisa melhor que você.

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