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sábado, 19 de abril de 2008

Nada sob controle.




















(Fotografia de Amanda Com –photo)


Nada sob controle.




Bateram à porta como anjos.
Do buraco da fechadura ela olhou timidamente e deu um giro na chave. Mal abriu a porta e eles anunciaram:
__Trazemos à Palavra. Somos mensageiros da Paz.
Antes de permitir que eles entrassem um já a olhou com sede. Nem bem respirou e já estava sendo estuprada por alguns mais atirados. Teve medo de gritar - algumas vezes o silêncio percorre a mente das pessoas como algo útil e elas se trancam. Vão para outro lugar.
Calada sentiu vários membros dos ‘anjos’ a penetrá-la. Ao final eles recolheram suas coisas e se mandaram.
Luana, branca como a lua levantou-se e foi para o banho, dolorida, envergonhada e com um sentimento de culpa sem explicação. Como aquilo poderia ter acontecido com ela que era tão precavida – interrogava-se constantemente.
Depois do banho saiu perfumada. Algum tempo e retornou com uma sacola escura. Trancada em casa por vários dias seguidos, sem dar sinal de vida, chamou a atenção de um vizinho que tocou a campainha vezes e vezes.
Sem obter qualquer sinal de resposta arrombou a porta.
Tudo estava limpo e organizado. Um suave cheiro de incenso de baunilha perfumava a sala.
Olhou tudo minuciosamente e dirigiu-se para o quarto. Porta trancada. Arrombou.
Um corpo caído e gritos.
Toda a vizinhança no quarto de Luana.
No telejornal da noite: __Assassina violenta mata vizinho. Certeiro tiro na cabeça.
Luana foi julgada e condenada.
Não aceitou padres ou pastores nas visitas. Tinha medo da Boa Nova.
Em uma manhã de abril encontram seu corpo frio e quase sem vida a um canto da cela. Faleceu antes de receber socorro.
Causa da morte, desconhecida.
Anos depois Thiago - o sobrinho - encontra o diário da tia:
“Hoje fui atacada por anjos. Amanhã poderei ser atacada por demônios. O homem tornou-se um animal capaz de tomar diversas formas. Tenho vergonha e medo. Estou cansada. Comprarei uma arma; preciso de proteção. Nunca fiz mal a ninguém e sempre trilhei caminhos corretos, só que nenhum filho da puta irá tocar-me novamente com violência”.
A irmã desesperada correu aos meios de comunicação. Queria que o nome de Luana fosse limpo. Não conseguiu grandes coisas. Luana já havia sido ibope como assassina.
E assim, algumas Luanas seguem pela vida e ‘anjos’ andam a solta pregando mentiras e destruindo vidas.

Brasil? Não...
O mundo virou uma imensa bola de neve e a cada centímetro que derrete, sua imundície é espalhada e ninguém nota. Pensando bem, cada um é responsável pelo que tem.
Clap, clap, clap para os idiotas, estes estão a levar o mundo para o abismo e depois poderão dizer que a culpa é do Aquecimento Global.
Resta saber é se não terão peso na consciência.
É preciso ver os pontos que são usados para alvo de críticas e avaliar se o que é criticado é mais importante do que aquilo o que está atrás bem oculto para passar despercebido as entrelinhas dos olhos e do cérebro.
Luana vitimada foi condenada... Os anjos prosseguem a espalhar a cultura do medo e da violência. Nem tudo é só o que parece.
O que está a acontecer é que infelizmente enxergamos apenas o que nos é dado de bandeja, ou seja, imposto.
O que penso depois de ficar imaginando a condição e o desespero da personagem fictícia Luana?
Não se constrói uma nova educAção com cartilhas antigas.
Despertar e contribuir para a formação de novas formas de ver é o único caminho.
Oriente-se! A diferença deve começar em você!


Eliane Alcântara.

8 comentários:

  1. Olá Eliane parabens, so vim dar uma olhada e gostei muito do seu poema, beijossssssssss

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  2. Ahhh grande poeta, vc sempre me surpreende pela positiva com seus poemas e seus textos, este tambem não foi diferente, gostei muito amiga, beijos.

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  3. escrever é um erxcelente exercicio...sairia um bom ensaio sobre a violência.

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  4. oi eliane,muitas luanas devem ter passado por isso de alguma forma,
    talvez nao tenham reagido tao
    radicalmente...
    muito bom...
    voce é bem ecletica...
    parabens...

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  5. Mais uma vez vc surpreende, parabéns pela versatilidade, seu dom de escrever incríveis textos, um bj , minha linda.

    Carlos Lira

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  6. Eliane, gostei muito de seu conto. Porém tenho algumas observações a fazer. O que percebo é que o conto, enquanto objeto estético, termina em "Certeiro tiro na cabeça.". Esse momento final, possiblita ao leitor que vá buscar as suas interpretações.
    O que acontece depois, é que você começa a explicar o conto e a trazer um ensinamento moral, e resvala em um discurso engajado que pode até transmitir uma mensagem, mas que, por outro lado, causa um grande dano ao seu conto, deixando-o muito limitado e impregnado dos jargões salvíficos.
    Desculpe-me pela sinceridade, mas é que gostei de como o conto inicia, do desespero causado pela invasão dos 'anjos', portadores da Palavra, da revolta da moça purificada pelo brutalidade. Tratar-se de uma linguagem arrojada, corajosa. O bom leitor é capaz de inventar os caminhos que se seguem, sem necessitar de um catecismo moral e apocalíptico. É isso. Abraços.
    JIVM

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  7. Eliane, concordo plenamente com as observações de JIVM. Deixe que o leitor tire suas conlusões, que ele fantasie ao gosto estético, moral, político, etc. Suas observações finais, após o tiro certeiro, em se tratando da "fictícia Luana", extrapolam a natureza estética da narrativa literária. E o conto é essencialmente narrativo, e não dissertativo. Um beijo.

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  8. Eliane, o José Inácio está certo. Seu conto é lindo, mas tem de parar no ponto certo (ninguém continua no ônibus após o local aonde tem de saltar). Deixe para o leitor as deduções que lhe cabem. Afinal, você não é sacerdote nem professora à antiga (risos).

    Uma coisa é indiscutível: seu talento não tem limites.

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