sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Sob o manto da lua negra


Sob o manto da lua negra os astros tornavam-se archotes para o seu caminho. Velar-se entre as ramagens densas do sombrio bosque, que era acometido pelo gélido e ruidoso vento, não facilitava o seu caminhar, mas, já se acostumara a transitar pela sinuosidade das madrugadas. Fora a vida que escolhera nestas pesadas horas.

A lua não era mais sombria que àqueles tempos... Nem, a rusticidade do bosque, nessas horas mortas, era mais trevosa que a intransigência humana hostilizando através da violência e sob o signo da ignorância, atos que julgassem pagãos.

Logo, a água fresca da fonte lamberia os seus cabelos e refrescaria o seu corpo, encobertos pelo pesado capuz da longa capa, vestes necessárias para a segurança nessa época de trevas.

As nascentes d’água traziam a energia curativa da Mãe, eram bálsamos para os enfermos. Também, as ervas se tornavam mais frescas sob o orvalho. Apressou-se para encher o seu cantil e coletar algumas ervas; sempre muito atento, pois as sombras eram tão perigosas quantos os seres.

Não muito distante, havia um grupo de pessoas a esperá-lo; os recursos xamanísticos faziam parte dos antigos costumes e atuais ritos.

Destinaram-lhe as incumbências de demarcar o círculo e acender a fogueira central. Não demorou, um agrupamento de pessoas o rodeou, ocultos em trajes semelhantes.

Bebeu do cálice da vida, entoou cânticos sagrados, reverenciou a Terra. Retirou o néctar dourado de um favo e o saboreou. Repartiu o dourado fraternalmente, agradecendo pela colheita, pelos frutos do trabalho e à fertilidade do solo. Festejou com os próximos a luz do sol, a divindade das chuvas, a temperança das estações do ano. Rompeu as noites e os dias e atravessou portais temporais. Vestiu novos trajes, participou de novas ordens cerimoniais, assimilou transformações sociais..., mas, continuou a pisar com os pés voltados para as estrelas.

Após sentir em sua nuca a água fresca da fonte, todo o seu corpo estremeceu. Despiu-se do tempo que oprime as eras e os passos e, pôs-se a nadar nu no lago.

Sua aura purificara-se e tornara-se translúcida com os primeiros raios do sol.

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