segunda-feira, 10 de março de 2014

Convidado Walter Bezerra (2)



Crônica sobre o fim do mundo

Sabemos que o mundo não se acabou no ano 2000, frustrando a interpretação de uma das centúrias do astrólogo, astrônomo, alquimista, erudito e mago francês Michel Nostradamus.
Agora, os donos da bola de cristal estão afirmando que o dia 21 de dezembro de 2012 será o fim do mundo (ou o início de um novo ciclo, como dizem os mais românticos), segundo previsão apocalíptica baseada na cultura maia.  
A premonição é que o Sol nascerá, no tal dia, aliado ao planeta e ao centro da Via Láctea, um fato astronômico que só acontece a cada 26 mil anos e que provocará o cataclismo, causando o fim da vida na Terra.
Em alguns países, como na Espanha, as pessoas de alto poder econômico estão construindo, em sistema de cooperativas, os famosos bunkers, refúgios subterrâneos emergenciais, para se protegerem da possível explosão do planeta.
Os bunkers permitem que as pessoas permaneçam no interior deles até 3 anos, respirando ar puro e sobrevivendo à base de medicamentos e alimentos estocados. Eles estão protegidos por uma capa de 60 centímetros de concreto e contam com filtros de partículas radioativas para evitar a infiltração de resíduos tóxicos ou a passagem de radiação ou bactérias.
A história dos bunkers é uma realidade inconteste. Mas, suponhamos que as pessoas realmente acreditem que o mundo vai se acabar em 21 de dezembro, eu fico a imaginar, cá da minha porção vidente hilária, o que poderia acontece, a partir de agora, diante dos efeitos colaterais causados pela síndrome do pânico generalizada:
Milhares e milhares de mulheres grávidas desesperadas por não poderem sequer conhecer a cara dos frutos de seus ventres;
Mulheres casadas – reprimidas, sofridas e traídas por seus maridos – pulando, por simples vingança, a cerca pela primeira e última vez;
Outras revelando, para seus maridos mulherengos, que tais filhos não são deles, mas dos vizinhos, patrões e amantes;
Outras ainda, agora estimuladas e encorajadas, revelando suas fantasias sexuais a seus maridos, namorados e parceiros de cama sexualmente conservadores;
Casais, namorados, amantes e pessoas de todos os sexos, classe sociais e culturas aderindo ao ménage à trois, swing e sadomasoquismo;
Recatados, caretas e falsos moralistas experimentando maconha, cocaína, LSD e outras drogas alucinógenas e “reveladoras”;
Boa percentagem dos católicos, evangélicos, mulçumanos, espíritas e outros crédulos rogando a Deus para que lhes salve as almas, posto que só eles - por serem religiosos confessos e praticantes - merecem mais do que ninguém sobreviver à tragédia;
Centenas de milhares de agnósticos saindo de cima do muro e fazendo opção definitiva por Deus;
Empresários e milionários gastando tudo com viagens, extravagâncias e orgias;
Maus políticos, insaciáveis, promovendo a farra do Dinheiro Público dos Últimos Dias;
Homens e mulheres de bem revelando seus quinhões corruptos camuflados;
Multidões incautas, pobres, honestas e sem grandes ambições jogadas ao deus-dará;
Empregados e bajuladores mandando seus gerentes, diretores e patrões tomarem no devido lugar;
Formação acirrada e célere de cartéis, empresários majorando os preços, inflação a todo pique;
Devedores debochando seus credores;
Aproveitadores e caloteiros adquirindo tudo a crédito: carros de luxo, lanchas, vinhos, uísques, jóias, casacos de couro e perfumes caríssimos, visando desfrutar os últimos prazeres da vida;
Bancos, financeiras e comércio varejista, atentos aos calotes voluntários e involuntários, limitando seus prazos de pagamentos de boletos, faturas e cartões de crédito;
Todo mundo, pessoas jurídicas e físicas, sonegando impostos, provocando a falência múltipla de países, estados e municípios e quebrando, por osmose, seus funcionários e fornecedores;
Tchau, tchau serviços públicos essenciais (saúde, segurança, educação etc.)!
Estupradores de plantão violentando ídolos, divas e paixões adormecidas e dissimuladas;
Homossexuais enrustidos assumindo suas opções e preferências sexuais,
Vegetarianos devorando carnes, inclusive vermelhas, e naturalistas comendo produtos de origem animal, incluindo enlatados;
Naturistas e exibicionistas desfilando nus pelas ruas, sem nenhum pudor ou constrangimento;
Comercialização massificada de confessionários eletrônicos aplicados em iPhones, (concessão já aprovada pela Igreja Católica), e a efervescência da prática do Sacramento da Confissão nas paróquias de todo o mundo;
Vaticano revelando, ainda que tarde, seus segredos históricos e eclesiásticos guardados secularmente a sete chaves;
Líderes de todas as facções religiosas revelando - em confissão e por desencargo de consciência - que Dostoiévski, Nietzsche, Saramago, Chaplin, Galilei, Reich, Freud, Einstein, Huxley, Epicuro, Fernando Pessoa, Thomas Edison, Charles Darwin e Lennon, entre inúmeros gênios, eram figuras sapientes, confiáveis, generosas e amáveis, dignas de serem ouvidas e seguidas;
NASA tirando do baú e divulgando, embora sem mais nenhuma serventia, suas descobertas científicas e pesquisas espaciais sigilosas;
Terroristas e homens-bombas explodindo de raiva, revoltados com o efeito bumerangue do colapso planetário;
Todo mundo, incluindo aidéticos, praticando sexo sem camisinha;
Pedófilos dissimulados praticando suas taras imorais e esdrúxulas;
Psicanalistas, psicólogos e terapeutas irresponsáveis seduzindo seus pacientes;
Homofóbos, racistas, chauvinistas, xenófobos e preconceituosos em geral praticando calorosamente suas aversões nefastas;
Depravação, obscenidade, parentes copulando com parentes, Sodoma e Gomorra se reeditando, tudo como Satã quer e gosta;
Pessoas revoltadas fazendo justiça com as próprias mãos, visando, por exemplo, vingar a morte do irmão assassinado ou a da mãe acidentada no trânsito;
Pessoas injustiçadas dando, numa atitude revanchista, o troco a seus déspotas e opressores;
Oportunistas e caras de pau vendendo terrenos na Lua e em Marte, à vista e em espécie, com desconto de 90%;
Internautas inescrupulosos espalhando boatos e defecando nas redes sociais contra seus desafetos;
Desesperados querendo ser, a todo custo, sequestrados por extraterrestres, só para fugir da calamidade;
Propaganda de lançamento de um novo produto de conteúdo religioso: “Adquira já o seu Invisilex. Fique invisível, livre-se da explosão e ganhe a eternidade!”;
Ecologistas ufanos defendendo e preconizando: “O Brasil tem tantas belezas naturais que Deus vai deixar o país de fora do curto-circuito!”;
Brasileiros satíricos profetizando (chupei da crônica humorística): “Fim de mundo no Brasil não! O país não tem infra-estrutura para receber um evento de grande porte como esse!”;
Grandes laboratórios farmacêuticos futurando zilhões e zilhões de euros com a pandemia de doenças como a antlofobia, astrofobia, brontofobia, termofobia, calipsefobia, demonofobia, somnifobia, meteorofobia e necrofobia, entre outros transtornos de ansiedade de nomes morfológica e semanticamente estapafúrdios e psicodélicos;
Superpotências mundiais pedindo (agora vá!) perdão à Humanidade pela ganância capitalista e ocupações imperialistas, que causaram guerras e mortes de milhões de pessoas inocentes em diversos continentes do Planeta.
Enfim, se as pessoas acreditassem plenamente na previsão apocalíptica, o fim do mundo seria um verdadeiro deus nos acuda, uma bagaceira sem tamanho e igual.
Mas, se eu fosse Deus, não destruiria o mundo não. Faria algumas reformas essenciais, justas e necessárias
Primeiro ato: em vez de Terra, o planeta passaria a se chamar Paz!
Em seguida, ignoraria essa conversa de herdeiros  do pecado original. Nada de pagar o justo pelo pecador! Nem aqui, nem na China!
Chega de tragédias: não haverá terremotos, tsunamis, tornados, vulcões, dilúvios ou qualquer outro fenômeno natural destrutivo em nenhum lugar do mundo!
Eu, o Todo-Poderoso, acabaria com a indústria bélica. Não haverá bombas nucleares, mísseis e nenhum tipo de arma de fogo sobre o planeta!
Eu, o Criador Onipresente, faria a reforma racial: não haverá brancos, negros, amarelos, índios.Todos serão coloridos! 
Eu, o Soberano Onipotente, implantaria a reforma geográfica: não haverá país maior que outro! Todos terão os mesmos metros quadrados e a mesma quantidade de recursos e belezas naturais! Todos falarão uma só língua e suas moedas correntes terão o mesmo valor cambial! Não haverá mais superpotências e nem impérios!
Eu, o Supremo Magistrado, faria a reforma moral: fora todos os corruptos, crápulas, usurpadores e ditadores de qualquer tendência político-ideológica!
Eu, o Senhor da Democracia, promoveria também a reforma social: todos serão realmente iguais perante a lei e gozarão dos mesmos privilégios materiais e culturais!
Eu, o Sumo Sacerdote da Alma, faria, com urgência e sem pestanejar, a reforma religiosa e espiritual: a partir de hoje, a religião do planeta será o Amor!
E, por fim, eu, o Onisciente, decretaria: não tentarás contra a natureza. A partir de agora, a consciência ecológica passará a ser matéria disciplinar obrigatória em todas as escolas do planeta Paz!



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Walter Bezerra
imagine.al@gmail.com

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