Ano
de 2007. Sentou-se diante do computador em postura altiva, superior e
preparou-se para digitar as primeiras linhas do seu romance. Caso acreditasse
em Deus, estaria convencido que o toque do Criador o contemplara com um talento
fabuloso. Era despeitado com críticas – no seu entender invejosas – aos seus
trabalhos anteriores exibidos na grande rede. O tolo desconhecia que Deus nos
brindava com um Rimbaud a cada cem milhões de nascimentos e, dada a
seletividade divina, o resto da humanidade não abraçara a genialidade aos 20
anos de idade.
Nem
um pretenso Deus muito menos os invejosos o atrapalhariam em seus planos de
brilhar o universo das letras, pensava entre muxoxos banhados de desprezo.
Manchou em tipos negros o virtual papel alvo que preenchia a tela com a
expressão “A História de um Grande Presidente”. Sacudiu negativamente a cabeça.
Um título demasiado simples para um livro candidato a eternizar-se nos meios literários
tupiniquins. Acionou a tecla “Del” e mandou “A História” paras os quintos dos
infernos digitais, substituindo-a pela expressão “Revelações”. Não gostou da sonoridade da palavra,
considerando o título pobre sem atentar para o fato de faltar vocabulário no
cemitério de idéias que era sua mente.
Buscou
no dicionário eletrônico alojado no HD palavras bonitas para compor o título.
Gastou cerca de uma hora pesquisando, juntando verbetes, amontoando expressões
sem sentido para chegar ao rótulo definitivo de sua obra-prima.
“Radiofotografia de Um Presidente” – escreveu desconhecendo todavia o
significado da palavra a encabeçar o título. “Ficou bonito...” – sorriu
triunfante.
Agora
faltava o miolo, a alma do livro. Como ignorava que uma biografia, mesmo
romanceada, tem a obrigação de se fiar na verdade dos fatos, inventou uma
história inverossímil a respeito do biografado. Ávido, escreveu cerca de dez
linhas para em breve estancar no deserto de criatividade a habitar sua caixa
pensante.
Não
se dando por vencido, enquanto tentava avançar em sua obra, alardeava em
espaços virtuais suas façanhas sem comprovação como escritor laureado.
Inventava prêmios recebidos, amigos escritores, gente famosa em seu rol de
amizades. Tudo ruía ante a menor investigação, mas ele tanto mentia que passou
a crer sinceramente em suas falsidades.
Estamos
em 2057. Dezessete laudas da “Radiofotografia de Um Presidente” foram compostas. Erros crassos de
concordância e regência povoam a pretensa narrativa, equívocos ortográficos
pululam o texto feito abelhas em torno de uma colmeia agredida. Nada ali é aproveitável. Porém, o escritor,
rosto carcomido pelas rugas, coluna antes ereta envergada para frente, castanha
cabeleira pretérita agora embranquecida pela crueldade dos anos, ainda se
engana. No jubileu de ouro de sua arrogância,
mirou a vista no título e exclamou “Sou um Gênio!” para em seguida dar
prosseguimento a sua triste e misantropa
sina.
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