terça-feira, 13 de março de 2012

Saída de Yosemite


Saída de Yosemite (Danilo Berardo)

                Aquela viagem em 1998 tem muita história, história para antes, durante e depois. De certa forma, mudou o rumo da minha vida, de forma lenta e consistente. Mas um pequeno pedaço dela foi inusitado.
                A ideia era passar a noite em Yosemite, não me lembro muito bem se vinha de São Francisco ou outra cidade, posso conferir isso depois, mas não é o mais importante agora. Lembro que o caminho já era cheio de emoções, com o Escort Sedan cheio de comidinhas da California e carregando toda a bagagem de novidades e descobertas na primeira viagem internacional sozinho.
                É claro que tinha mais bagagem que comidinhas, mas elas afetaram a possível parada em Yosemite. Ao passar pelo portão do parque, recebi um panfleto mostrando os possíveis riscos de deixar comidas no carro ou por perto de onde estivesse hospedado. Algo como ursos bem famintos. Segui esperando poder conseguir um quarto seguro, mas ao chegar na recepção da hospedagem, só havia barracas de lona. Era pegar ou largar. Era fim do dia.
                Achei que ir embora de lá não seria tão ruim, tinha mais coisas para ver pela California, não tinha muita noção de quais cidades teria pela frente. Sabia que o carro tinha só meio tanque de gasolina e postos não eram muito fáceis na região. Tinha que decidir logo. Naquela época não tinha celular, nem GPS, nem Google Earth!
                Decidi sair do parque e continuar rodando como era o plano do dia seguinte, caso tivesse o quarto melhor. O sol começava a se esconder por trás das árvores. Eu já estava lá e queria dar uma olhada rápida, pelo menos. A olhada rápida tinha que ser de no máximo uns 30 minutos, segui rodando um pouco.
                Depois dos 30 minutos, o sol já era quase apenas alguns raios. Pensei que era o limite, tinha que sair do parque. Comecei a tentar achar a saída, mas parecia que não via o caminho correto. Algumas partes tinham opções de 3 ou 4 caminhos, havia perdido um pouco a noção tentando olhar rápido no tempo que tinha, mas não percebi por onde havia passado.
                Não podia gastar muita gasolina, não tinha onde me hospedar, tinha o panfleto dos ursos famintos na minha mente e o dia indo embora, chegando a noite. Nada pior que estar perdido ao cair da noite, se com luz não sabe-se onde está, imagine sem luz. E em estrada sem postes...
                Ficar preocupado com esse tipo de desconhecido nunca foi algo muito preocupante para mim, gosto do novo, das possibilidades de caminhos inusitados, mas ali algo estava pior e começando a ficar aterrorizador.
                Escuro na floresta, sem ninguém por perto, era o cenário perfeito para começar a pensar coisas desagradáveis. Fiz uma oração silenciosa. Preciso sair daqui. Preciso de ajuda.
                Há quem acredite, há quem não.
                Vi uma pessoa andando na beira da estrada, acelerei até ela, não pensei em mais nada. Era uma pessoa, sim. Parei do lado, acenei e perguntei diretamente: Como saio do parque? Me perdi e não acho a saída. O braço indicou a estrada e disse apenas: Por ali! Não tinha tentado aquela opção ainda. Acelerei, gritei: Obrigado.
                Olhei para a estrada, tinha que ser ali. Olhei pelo espelho, não vi mais ninguém. Por um momento percebi que não podia lembrar do rosto da pessoa. Não lembrava mais nada da pessoa, apenas me lembrava da voz. Que coisa, seria um sonho? Continuei na estrada, não lembrava da pessoa, só da voz. Ela ecoava sem rosto para lembrar. A estrada apontada me levou para o portão de saída.
                Fui em frente, uma estrada escura, solitária. Eu precisava parar, descansar. Pararia no primeiro lugar. Eu ainda lembro da voz, mas não do rosto, lembro do espelho vazio. Quem esteve ali?
                Mariposa. Sim, a primeira cidade era a pequena Mariposa. Pousei nela, dormi e segui o caminho. Sem nunca saber quem apontou a estrada. Ou talvez sim...

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