sexta-feira, 22 de julho de 2011

A cadeira


Ali sentado. O cansaço bate. E nada acontece.
E o cansaço bate mais forte. Bate no corpo, bate no rosto. Não há distração que faça o relógio correr. Ou ao menos andar. No momento, ele parece parado. Parado naquele momento. Todo o resto correndo. E ele parado.
Esperando.
Esparramou-se na cadeira. Como um sorvete que se der­rete na casquinha. Tomou a forma da cadeira. Inerte. Angústia, cansaço. Uma dor que não sabe ao certo se é no pescoço, na nuca, nas costas ou nos três.
Esperando.
Pegou mais um café. Já é o terceiro (é grátis mesmo). Sen­tou novamente, corrigiu a postura. Queimou a ponta da língua. Arqueou novamente a coluna, tomando a forma da cadeira. Su­biu o olhar para o relógio. Aproximou o copo da boca e asso­prou. Seguiu assoprando. O café esfriando.
Esperando.
Pensou que podia ter aproveitado melhor esse tempo. Umas horinhas poderiam fazer alguma diferença. Talvez pu­desse ter adiantado aquele trabalho. Podia ter conversado com alguém interessante. Chegou à conclusão de que nada o impe­dia de conversar com alguém ali mesmo. Era o que pensava. Na prática percebeu que muita coisa o impedia de ter uma boa con­versa. A pressa, o medo, a tendência a não falar nada interessan­te, a falta de intimidade, o distanciamento mínimo comum, o pensamento múltiplo comum, as idéias vagas, as vagas idéias, as idéias procurando vagas, sem espaço para estacionar em meio aos transtornos que ocupam as mentes. Desistiu após duas con­versas sobre o clima, quatro sobre futebol, uma sobre violência e outras três sobre religião. Caminhou desoladamente, de volta para sua cadeira. Não que fosse sua, mas aquela onde ele estava antes, na qual devia ter sentado muita gente diferente. Tentou fazer um cálculo de quantas pessoas deviam passar ali por dia, dividir pelo número de cadeiras e talvez chegar a um número médio de pessoas por dia naquela cadeira. Podia fazer um livro só sobre aquela cadeira e os tantos personagens incomuns que passam por ali. Mas desistiu da idéia. Esparramou-se novamen­te na cadeira. E ficou ali.
Esperando.

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