terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Ton-sur-ton

Agora não quero falar
de coisas coloridas,
bonitas, delicadas,
de flores e borboletas.
Não quero falar de nada.
Hoje estou monocromático.

Por que não cantar o cinza
do asfalto e do cimento,
da gasolina e do diesel,
da poeira e da fuligem?

Por que não cantar o cinza
duro, frio, onipresente?
Os diversos tons de cinza
sobre cinza da cidade?

E uma vez cantado o cinza,
concreto armado e neblina,
e pintada a cidade em P/B,
aí, sim, falar de flores
e até, talvez, borboletas.
Sobre o fundo de cimento
não mais apenas bonitas,
mas praticamente perfeitas.

domingo, 27 de dezembro de 2009

Ocorrência 2831/09

— Sabe... os minutos parecem dias, as horas são semanas, o meu viver parece que está suspenso, não planejo mais nada, não penso no futuro, não imagino o que me espera na rua seguinte, comprar um pão a menos todo dia pela manhã é um suplício, só consigo pensar na minha criança, 15 anos... Nunca tinha me dado trabalho, nunca demonstrou estar com problemas, e, de uma hora pra outra, some. Cada um fala uma coisa: um que fugiu com uma paixão que ninguém conhece, outro que foi vítima de seqüestro e tá no estrangeiro, mais um que aposta que morreu nas mãos de um doido, ai... é uma dor forte que aperta o coração, entende? Tenho mais dois filhos, mas cada um é único, a falta de um não é compensada pelos outros... Um mês, oito dias e três horas. Foi a última vez que falei com minha criança... estava normal, sabe? Não parecia estar com problema nem nada. Ia pra casa de uns amigos ver um filme, mas não chegou lá. Oitocentos metros. É pouco, né? Percorro o caminho da minha casa até a desses amigos todos os dias; são cinco ruas que me cruzam o caminho, fico imaginando em qual delas minha criança subiu. Ou desceu... trinta e oito dias de ausência, e não saiu uma nota no jornal, um comentário na televisão, ninguém se ofereceu pra fazer panfletos, página na internet, então, nem pensar. Aqui na periferia não é o primeiro caso, mas quisera que fosse o último, a dor é demais. Sabe, pode até ser estranho falar isso, mas beleza não era seu forte, não chamava a atenção de ninguém, só gostava de ver filme com os amigos e ler as poesias do Vinicius, aquele do “... que seja infinito enquanto dure.” Conhece? Nunca vi alguém com o seu jeito na capa dessas revistas de famosos. Mas era minha carne, meu sangue, minha história, que talvez não tenha continuidade. Ninguém tem conhecimento pela TV, pelo rádio, ninguém se pergunta “onde estará?”, não apareço chorando na frente das câmeras, mas, pode acreditar, a dor é a mesma que a dos parentes dessas crianças bonitas que somem, e cujo rostinho aparece nos cartazes e nos outdoors. É infinita. E pra sempre dura.

Conto premiado com o 2º lugar no concurso literário promovido pela ULBRA (Universidade Luterana do Brasil), com sede em Gravataí (RS).

Conheça o site www.desaparecidos.com.br

quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

Série: Cabeça Oca I



1. Toda vez que ouço alguém chamar a mulher de um governante de 1ª dama... não sei se acontece contigo, mas eu sempre tenho a impressão de que tem uma segunda, uma terceira...e, por aí vai.



quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

A chave

me desejam feliz ano novo
de novo
e tudo é velho
olho no espelho
vejo a barba branca de Noel
finjo fazer seu papel
e no ô-ho-hoooo
dou
um sorriso desbotado
tão falso quanto o algodão jogado
fingindo neve
e quando alguém se atreve
a dizer "abra a janela da felicidade em 2010"
meto as mãos pelos pés
e pergunto: cadê a chave do cadeado?

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Miserável

- Mais um!

- Desculpe-me pela indiscrição, mas o senhor já não tomou muitos?

- Mais um, porra! Não estou perguntando merda nenhuma, eu quero mais um! Eu pago a merda do seu salário, quero tomar mais um e você tem que me obedecer!

Abaixando a cabeça, o garçom atendeu-lhe prontamente. Era mais um sorriso que ele mandava goela abaixo, embebedando-se do pouco poder que tinha.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

domingo, 20 de dezembro de 2009

Ouve


Ouve o silêcio, viajante ouve o silêcio
Veja a maravilha que nele habita
Esteja lá e viva cá.

Caos, violência e insensatez

No silêcio tudo se disfaz
Lá não há forma,
Há apenas paz.

sábado, 19 de dezembro de 2009

Do humano.


(Imagem: Google).

Do humano.


Nunca espere que as portas se abram sós,

é preciso ternura para tocá-las.



Não entre sem convite,

é na magia do olhar que se reconhece,

a existência da vontade de habitar.



As janelas guardam segredos,

nunca ouse espreitá-las, modele o interior.



Não afaste do corpo a alma,

não é assim que se ama ou se faz amar.

Aprenda a cativar o que pretende alcançar.



Não respingue passado no presente,

é do futuro que nascerá a felicidade.



Deixa a beleza sua vida enfeitar,

e mais tarde, bem a frente, sorria,

a vida é bela, para quem a ela, com amor se dá.



Eliane Alcântara.
 
 
A todos, Boas Festas!

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Temporão


Num beijo que nem chegou a ser de amor
é onde estou agora

Era terra infértil de novo
e eu ali me semeando

Não sei que problema há nos meus olhos
e nos meus sentidos

Era superficial e fogo
e eu ali me semeando

Trovões e relâmpagos
alertavam da chuva
que não veio

Por que se injetou na dança, nos planos, nas ancas
se não era para durar?

Tudo o que é demais não cabe
e em silêncio recolhi as minhas sobras

Morri semente sonhando com podas

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Alfarrábios


Percebo uma ruptura que me duplica.

Mas sou feito de ferro e concreto,
fissuras não me comovem.
Já sou azul e amarelo,
preto no branco,
e uma velha testemunha do conformismo.

O sopro que fere meu rosto
é a prova da fragilidade desta armadura.

Redimo-me da canção subalterna a um desejo ocre.

E que não me faltem alfarrábios
para dizer da crueldade dos anjos,
que infernizam minhas noites
e me visitam nas manhãs opacas
pintando-as de tons pastel,
feito palhas que incendeiam sutilezas
e espalham a fumaça:
ardência dessa angústia nos meus olhos,

asas que se queimam em pleno vôo
sobre um chão que já não há.

(Celso Mendes)

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Parcas luzes...

(Sonia Cancine)
.

Pudera...
Ter a leveza dos pássaros
A delicadeza das pétalas e
Os sentidos felinos.

Quem sabe assim, sobreviveria
Em meio à tormenta escura em que vivo?

Por assim dizer, respiro.

Respiro lágrimas silenciosas
Que exalam cristais

As parcas luzes
De meu finito desejo
Apagam-se e

Eu não posso mais ver a luz...

Dói-me os sentidos por perceber a alma tão pequena.

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Fúria Selvagem


Meu ódio é extenso e implacável,
É uma fera faminta e voraz
Que corre sobre tua sombra.
Não espere que eu tenha piedade
Ao hesitar em lhe atacar.

Em minha mente tu sofres demais,
Com meus olhos calculo tua distância,
Com meu nariz sigo teu rastro,
Com meus ouvidos busco teus sons
E com minha boca hei de lhe rasgar.

Minhas mãos estão armadas,
Minhas pernas lhe perseguem,
Chore e esconda-se
Cale-se e finja que sumiu
Eu vou encontrá-lo.

Tua pele será separada da carne
Em uma bruta tortura sem igual.
Acabou-se tua existência!
Tu és caça, eu sou caçador
Essa é minha fúria selvagem.


- Mensageiro Obscuro.
Novembro/2009.


Foto: "Dante and Virgil in Hell" de William Adolphe Bouguereau, 1850.

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Yin

talvez narrativas fiem vidas.
talvez eu não tenha sido como me contei,
talvez nunca serei.
talvez não haja eu, apenas a tecelagem contínua entre dois pólos,
cujo projeto (que desconheço)
pulsa-me a traçar teias de associações arbitrárias,
sentidos trans-lúcidos,
dissipáveis pelo toque da dúvida como bolhas de sabão.

por trás do véu, a natureza sem foco
a noite, as coisas que acontecem
sem sentido ou intenção:
aqui se faz um mundo,
outro ali, em outra oitava
... e o momento um acorde,
dedilhado em terças e sextas e não haja maestro.

talvez os homens das ciências sejam certos e o nosso multiverso seja órfão.
talvez sejam mais loucos que os fanáticos da sé.
talvez seja só uma questão de abstração inútil e as coisas façam-se porque assim são feitas,
ou ao invés de aranhas sejamos primatas que descobriram o sentido ou a falta dele
e houve um alberto caeiro.

talvez nossa narrativa tenha enrijecido idéias,
platônicos discretos exilados na ponta do iceberg.

talvez apolo e dionísio fossem gêmeos e a virgem tenha nascido do oráculo.

talvez os hindus estejam certos e um deus me sonhe
ou tudo seja o espelho e o tigre que são o mesmo
como borges e tirésias, que alertaram para a escuridão.

talvez eu esteja errada, talvez eu creia.
teço um labirinto em que sei e outro em que queimam meus pecados
e outro em que sou louca ou nada.
sirvo a uma lenda que conta a natureza em mim,
a maior das minhas histórias e a inevitável e que talvez seja a poesia.

teci mundos olhando para os antigos, para os sonhos que me antecederam.
teci veias para me enterrar na placenta
e redes hídricas e vermelhas para me reunir em alguém que depois chamaram de um nome escandinavo.

talvez seja a verdade última, o naufrágio
e eu me derreta no oceano frio do mundo
como o gelo no copo
do uísque do meu pai.
talvez a vida me perpasse e desgaste as paredes dos meus poros, me levando em pó
para o deserto quente onde o tempo nasceu como naquele sonho desconexo,
e o tempo seja o deserto e o vento.

ah, dançar com o talvez da Dúvida,
a deusa voraz por epistemologia e altares pagãos como a noite pelo dia.
tolerar o calafrio do espelho na água da superfície e mergulhar no frescor não sabido,
em nem um pio das corujas que alerte os futuros.

o peso do infinito, matéria-prima do fio,
os deuses e a Certeza, outra deusa
enlouquecida em descrédito:
fiar-se com belos dedos, única âncora que há.

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

ARCANO 16



o vento brinca com a árvore na janela
e tua voz vem riscar a vidraça

é tão tarde

quando sussurras teus versos
em rimas surreais
que deslizam pelos meus sonhos
junto com umas lágrimas descabidas

é tão tarde

para riscar peles e vidraças
até os mortos sussurram
longas árias 
em cadencias insanas
enquanto você chora
em rimas perfeitas
murmura histórias arcanas

versos
música
hosanas e teu corpo

é tão tarde

eu sussurro
os mortos mentem 
em línguas mortas
enquanto a tua desliza
no céu da boca
segredos estelares
bobagens seculares

mentiras de vento e folha
que eu finjo não ver
nesse gozo esquecido
perdido entre as frinchas da noite
eu entendo
tudo, ou quase tudo,
de tudo que nunca entendi

meus olhos ardem
e te esquecem um pouco mais
fecho o livro sem pressa
guardo o poema junto aos meus 
que dormem sozinhos

teus mortos sussurram
é tão tarde

O rapaz do guarda-chuva cinza


Eu podia dizer apenas isto: o rapaz estava no ponto do ônibus. Usava um terno cinza e um guarda-chuva cinza. O mendigo parou de passar para nos dizer como um profeta manso: que não choveria aquele dia, que nunca mais choveria, porque naquele momento não chovia e o tempo, o tempo, meus senhores, estava irremediavelmente parado (aliás, acho que ele disse: encrencado).

Estes foram os fatos visíveis. Os outros fatos é que me incomodam. Vou completar a estória: o mendigo puxava um cachorro com o pensamento. O cachorro era muito mais bonito, o cachorro era como um nobre russo que viajasse incógnito, o cachorro estava sujo e provavelmente doente. E o mendigo puxava o cachorro com amor. Por que, meu Deus, tenho que falar nisso? Um cachorro é tão irrelevante.

Esse não era. Ou eu é que vi com os olhos do mendigo. Que não devia ter parado de passar naquele instante. Porque então o cachorro viu o rapaz do guarda-chuva.

É importante lembrar que o guarda-chuva era cinza, já que isso prova que o rapaz não existia.

Eu acho que o rapaz não existia; olhava o mundo com tanta confiança que não podia ser.

O cachorro viu o rapaz e pensou: eis um amado. Era. Tão amado que não se importava. No ponto do ônibus as pessoas com calor e vontade de ir para casa esperavam que o mendigo dissesse outras coisas sobre o tempo. Uma criança estendeu a mão para o cachorro. E foi então que o tempo realmente parou, tudo se interrompeu no meio. No meio de eu piscar e respirar, a criança e a mão estendida receando tocar, o cachorro tenso com a descoberta de um amado, o mendigo à espera de que o cachorro andasse outra vez, o rapaz não percebia nada.

Vem, pensou o mendigo com amor. O cachorro não se moveu. Vamos, pensou o mendigo. O cachorro fascinado. Ele não quer você, vi o mendigo pensar.

Então o cachorro disse: ninguém escolhe um cachorro. Se eu andar atrás dele, ele é meu dono. Ainda que não perceba será meu dono. Ainda que me queira enxotar com seu guarda-chuva cinza, eu insistirei e ele será meu dono.

Mas você, meu amor, você tem dono, pensou o mendigo com lágrimas na voz.

Num sobressalto o cachorro olhou para o mendigo, surpreso por descobrir com que intensidade era também um amado. Decidiu-se. (Eu assistia, meu Deus, uma intrusa, que fazia eu em meio a tanto amor, em meio a uma piscadela e uma expiração?) O mendigo deu um passo, blefando, fingindo que ia. Mas o cachorro tinha se decidido e foi também, um olhar de vaga saudade para o que não existia.

O tempo se moveu de novo, eu exausta de sentir o amor alheio.

Foi bom que o cachorro não ficasse, porque logo o ônibus chegou, e num ônibus nenhum cachorro pode seguir o dono.

sábado, 5 de dezembro de 2009

No sanatório





Ali deitada, no meio de sua urina e de suas secreções, mais parecia um bicho sujo, feio e repugnante. Recordava de suas horas, de suas noites, antes de estar ali. Unhas pintadas num carmim encarnado, cabelo sempre arrumado e do cheiro de lavanda que tinha. Não era mais nem a sombra daquela mulher, finalmente estava livre das pessoas, das taças cintilantes, dos burburinhos, das risadas falsas, das superficialidades. Tinha saudade do vinho de boa safra, de seus cigarros.
O canto mais escuro daquele quarto a acalentava. Mesmo com todas as perturbações diárias, ouvir os gritos que vinham de fora, despertar no meio de sua própria imundice, sentia-se melhor ali do que no meio de tanta hipocrisia.
De sua janela gradeada podia ver o jardim, cheio de margaridas brancas, petúnias, havia manhãs que as rosas sussurravam, riam-se dela e em outras as abelhas faziam um barulho ensurdecedor.
Logo uma enfermeira perceberia que ela estava acordada e viria cuidar dela.
As pessoas daquele lugar a tratavam bem, só fugiam à regra quando tinham seus problemas pessoais, descontavam nas injeções, na maneira de tratar os pacientes. Por suas mãos sabia quando estavam bem ou não.
Elas eram boas, davam-lhe banho, falavam com ela, mas preferia os enfermeiros, eles eram tão cuidadosos.
Agora limpa e composta em sua camisola de algodão cru, sentia-se mais humana. Bem que ele poderia chegar agora, ver seus cabelos ainda molhados, seus olhos calmos de abril. Seu coração batia no compasso dos passos dele, o sentia bem antes que entrasse no corredor, vinha com seu jaleco branco azulado, que cheirava água sanitária, sua marcha percorria toda a ala, para depois invadir seu quarto.
Seus passos tinham um barulho diferente, cada passo dele era um orgasmo latente nela.
Suas passadas aproximavam-se sisudas até a porta de seu quarto, mas quando entrava e fechava a porta parecia trazer toda ternura em seu olhar. Ele trazia a civilidade que ela necessitava, trazia suas mãos, com seus dedos finos e toque suave. Ouvia seus batimentos cardíacos, viraria seus olhos, olharia sua língua.
Seus dedos fugiam do estetoscópio, procurando os seios e naquela altura ela se lembrava de como eram os homens, só queriam saber de si, mas ela já não se importava mais, tinha sido mandada para aquele inferno, por ter descoberto seu marido infiel e pedófilo. Conhecia bem os homens, pelo menos com aquele era diferente, ele a usava e ela tinha consciência disso e o usava também. Talvez nem soubesse dizer quem era a vítima real do assédio, olhava-o com desejo e queria-se limpa para esperá-lo.
Já havia perdido a conta de quantas vezes ergueu a camisola, para que a olhasse, para que a tocasse. E numa noite de surto psicótico seus dedos descobriram seu colo, seu sexo e tudo o que queria acontecera ali.
Apenas suas visitas quebravam as crises temperamentais, a vontade de gritar e de se matar. Ele não sabia, mas se tornara o sentido da vida dela, embora César sempre aparecesse para visitá-la, ele era como um irmão, respeitoso demais.
Enquanto gozava, pedia baixinho por mais calmantes, queria ficar desacordada, chegava desejar ser estrangulada, por não suportar mais a vida.
Ela não tinha cura, se ele a liberasse se mataria. Esquizofrenia, alucinações, faziam parte de seu quadro clínico. Jurava ter feito sexo com todos os enfermeiros dali, mas nenhum admitiria tal fato. Mas o psiquiatra era sua razão de viver.
No fim, ele tinha o cheiro dela em seu jaleco, que já não estava tão alvo, ela recebia uma dose de calmante e dormiria até o outro dia, para acordar no meio se suas secreções.
Mas naquela noite, tudo seria diferente, ela conspirava meses consigo mesma, até pensar em uma maneira de se livrar de tudo.
(...)

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Camuflagem de Rapina - Flá Perez

Não há mais espanto
que me pegue:
essa nau de pau e corda
- embora ande à solta -
agora sabe
a ponta do iceberg.

Soldado em noites de atalaia,
os olhos de mil lentes
já percebem
a conjura e a intriga
das tocaias mais antigas.

Um mal lento e paciente
fingindo-se água pura,
matava-me antigamente.

Nonsense. Não mais.

As bactérias degeladas vão caindo,
inertes,
no fogo bento do meu sangue
de fervuras e vontades
imorais.