sexta-feira, 29 de março de 2013

Meu nome todo


Do começo ao fim,
me pronunciou:
Nome Sobrenome.

Da sua boca
ao pé do meu ouvido.
Era eu mesma.

Não me doeu
seus olhos inteiros
sobre mim.

quinta-feira, 28 de março de 2013

"O Homem e a serra"


“O homem e a serra”

A barreira de homem da cidade do litoral e o homem castrejo precisa de ser vencida nem que seja à custa de algumas noites de aguardente, coisa que nunca estive habituado, mas talvez seja uma das saídas. Penso que o problema está comigo, eu é que terei de me libertar de preconceitos citadinos.

Serei eu um bicho-do-mato? – Que mania eu tenho de me denegrir! Arr! Valha me DEUS!

Não pretendo que as pessoas da cidade, conhecendo-me há cinquenta anos, pensem que fugi delas. Optei por mudar de vida, e de ares para respirar. Estava a precisar da serenidade da serra, fugir ao tráfico automóvel e constante mau-olhado que me vigiava no dia-a-dia.

No mês de Agosto a aldeia veste-se de cor com a vinda dos filhos emigrados em França. São as motos quatro, todo terreno, enfim, a civilização chega à aldeia. Muitos dos filhos dos filhos emigrados, crianças até aos dez anos já pouco português falam. São franceses de origem portuguesa que os pais fazem questão de os trazer às suas origens. Não são rebeldes, tem no sangue a alma de Portelinha, das suas gentes bondosas.

Terei que ter um pouco de paciência com este movimento inesperado. Na última semana de Agosto já terão partido para o país que os acolheu e lhes deu trabalho porque Portugal não lhes soube dar.

Tenho andado surpreendido comigo, os meus medos existências têm desvanecido de dia para dia. Preocupo-me pouco o que poderão falar de mim aqui em Castro, não tenho provocado qualquer tipo de celeuma entre esta gente, tento integrar-me o melhor possível. As pessoas já então a habituar-se à minha presença diária. Gosto de descer até à vila e pelo caminho observar os vários e bonitos cães Laboreiros que deambulam pela estrada, em atos pacíficos, de meros observadores de movimentos. Tem um porte de respeito, mas muitos dóceis.

 

Excertos do Livro: “ Diário do Medo na Existência “, escrito no lugar da Portelinha, Castro Laboreiro

 

Quito Arantes/Portugal

Declaração de amor




Na hora fosca da morte

é sua sombra que quero distinguir

sexta-feira, 22 de março de 2013

Incapacidade


Eram feitos um para o outro.

Ela muda. Ele cego.

Ela muda. Ele surdo.

Cansada de mudar sem ser vista ou ouvida, ela fez um enorme discurso de despedida.

Ele mudo.

quinta-feira, 21 de março de 2013

Crescente


 
Seu sorriso azul

É a lua festejando o sol

No espelho do céu




Imagem da web: "O beijo" (1931) - Pablo Picasso.

sábado, 16 de março de 2013

Prestigio de amar

Paola andava mais sorridente nos últimos meses. Os seus amigos perguntavam o motivo e ela preferia só sorrir. 
O fato é que o amor muda a vida, os pensamentos, e os sorrisos.
Pedro começou a andar mais observador nos últimos dias. As flores se tornaram mais coloridas, os cheiros mais intensos, as pessoas mais bonitas.
O fato é que o amor muda a vida, os pensamentos, e os sorrisos.
Paola e Pedro nem se conhecem.
Ela trabalha em uma indústria de material de construção.
Ele é entregador de pizza.
Paola foi a festa de formatura de Jussara, que se formou em matemática. Paola conheceu Rodrigo, pois ele a convidou para dançar. E ela aceitou.
Pedro foi pescar com alguns amigos, precisou comprar mais cervejas e ele foi o escolhido para ir até o bar mais próximo, onde conheceu Fernanda, a atendente.
O fato é que o amor muda a vida, os pensamentos, e os sorrisos.
Pode ser que Paola e Pedro tivessem se conhecido nessas estradas da vida. Mas o destino fez com que ambos conhecessem outras pessoas. Cada um está sorrindo no momento. Onde beijos são eternidades, e sonhos são desejos a serem realizados.
A vida é cheia de mistérios, e o amor é um deles.
Se for permitido, o coração vai conhecer o que os olhos podem ver. Basta que possamos dar a oportunidade.
Afinal, o amor muda a vida, os pensamentos, e os sorrisos.

quinta-feira, 14 de março de 2013

O Dreno


O Dreno

A cabeça pesa
O pescoço mói
O olho vermelho
A boca seca
As mãos geladas
A garganta arranha
Tosse seca
Respiro fundo
Cansado
Estafado
Fecho
Os
Olhos
Z
.

quarta-feira, 13 de março de 2013

A acidez das coisas sensíveis aos dentes

Mordeu a cebola com altivez e mastigou solenemente.
Depois, chorou. Por horas. Sem parar.
Não se sabe se pela cebola. Ou pelo coração.

terça-feira, 12 de março de 2013

AnTeS

Antes eu amava...a ela
Antes eu respirava...por ela
Antes eu lacrimejava...com ela
Antes eu sagrava...ela
Antes eu me exercitava...pra ela
Antes eu corria e a vida era uma correria...por ela
Antes eu esvaecia e surgia...pra ela
Antes eu não tinha...nada...sem ela
Antes eu correspondia a tudo...por ela
Antes eu sorria, mesmo chorando...quando a via... só ela
Antes eu lassiava, mesmo estafado...no colo dela
Antes eu namorava, mesmo guerreado...com ela
Antes eu ouvia, mesmo surdo...os murmúrios...dela
Antes eu falava, mesmo mudo...o nome...dela
Antes eu sonhava, mesmo desperto...o sonho...dela
Antes eu acordava, mesmo soporizado...antes...dela
Antes eu me concentrava, mesmo confuso...com ela
Antes eu comia, mesmo sem fome...a comida...dela
Antes eu bebia, da sua boca...o espírito...dela
Antes eu ia, mesmo hirto...ao encontro...dela
Antes eu sentia, mesmo inerte...os sentidos...dela
Antes eu previa, mesmo cego...o futuro...com ela
Antes eu tinha, mesmo faltando tudo...ela
Antes eu cabia em meu mundo...com ela
Antes eu me equilibrava, mesmo caindo...ao lado...dela
Antes eu podia, mesmo impotente...tudo...com ela
Antes eu sabia, mesmo leigo...tudo...ao lado...dela
Antes eu jazia, mesmo finado...a vida...com ela
Agora perpetro e contenho tudo isso
Por alguém bem mais importante
Que conheci ontem...hoje
Há alguns instantes
Eu

sábado, 9 de março de 2013

O RICOS ACHAM QUE A COMPRARAM



Angra dos Reis
Natureza inexpugnável!
Estupenda
Os ricos acham que a compraram
Só rindo
Eu
Agora
Sozinho
Na rede
Varanda de Condomínio com Iates
Lanchas
Jet skis
Proprietários esnobes
Escuto Djavan no Cd Player
Lap-top no colo
Digito numa banda larga
Parece até que sou um deles, rico.
Grandes merdas
Minha mulher
Suas amigas gostosas
Seus namorados maurícios
Todos na Cachoeira-bar do “magnífico” condomínio
Cachoeira natural deságua no mar
Mundo lindo!
Nosso
De todos
Inclusive
E porque não
Dos proletariados
Mulheres passam na rua
Algumas me veem
Vejo-as
Lindas
Criadas com Leitinho Nanon
Será que gozam com seus maridos
Penso não
Estão preocupadas em serem vistas nas suas Mercedes
Um segurança do condomínio vem falar-me
Pede
Retirar meu velho Santana 85 da rua
Deve estar atrapalhando os Porsches
Pobre segurança
Ele acha as enseadas e cachoeiras
O condomínio
Serem dos esnobes donos do dinheiro
Não querem ver meu Santana velho por aqui
Só rindo

Pablo Treuffar
Licença Creative Commons
O RICOS ACHAM QUE A COMPRARAM de Pablo Treuffar é licenciado sob uma Licença Creative Commons Attribution-NonCommercial-NoDerivs 3.0 Unported.
Based on a work at http://www.pablotreuffar.com/.
A VERDADE É QUE EU MINTO

A VERDADE É QUE EU MINTO

quarta-feira, 6 de março de 2013

é big! é big! é hora! é hora!



nos distantes idos dos outroras juvenis, escritores melancólicos enxotavam seus corvos com asas de graúna e apetite for destruction para dentro do meu cérebro pulsantemente confuso, convencendo-o - e ao resto de mim - que a vida era um enorme monturo de merda de vários gatos preguiçosos embrulhado em um véu colorido com aroma de jasmim. intermitentemente e sem dó bicavam minha cachola, até acenderem os candelabros da razão-que-não-se-cala: os bons da literatura, do cinema, da música, de toda arte que vale à pena, morrem jovens. não demorou e a certeza veio, indefectível, incandescente, luminosa e sorridente: não quero passar dos 40. com toda a solenidade que o momento exigia - tinha 17 anos, porra! - comuniquei meu desejo à mamãe, que ficou me olhando com aquela expressão de "coitado do meu filho... maluquinho, maluquinho... também, passa o dia inteiro lendo..." bom, o tempo passa, o tempo voa e a poupança bamerindus? a meia-idade chega e muda a porra toda. morrer antes dos 40 o escambau! eu quero é rosetar, beber, fumar, comer, cagar! quero descobrir a pedra filosofal, se existiu mesmo esse tal de cabral, se quem vence a batalha, no final, é o bem ou o mal, se entre a branca de neve e os sete anões rolou um furimfumflau. trinta minutos me separam da virada fatal. rezem, orem, persignem-se, prostrem-se, façam preces por mim. se chegar aos 41, a cerveja e o amendoim japonês são por minha conta.

Carlos Cruz - 14/12/2012

segunda-feira, 4 de março de 2013

ORIGENS





Eu sou aquele que de pés rachados
veio do meio do nada,
da vastidão do cerrado
da suculência da carnaúba
e do caroço do pequi:
foi ali que me formei
foi ali que nasci


Eu sou aquele que não toma mais a “bença”
nem dança a catira
não por orgulho
nem falta de crença;
mas por este modernismo suburbano
que me entope as veias
e me fez pensar quando aqui cheguei
que era um anjo ao contrário, de asa preguiçosa
e que de arte em arte se tornaria gauche:
“Vai Tião, vai se lascar nessa vida horrorosa...”


Eu sou aquele menino feio do viaduto da Redenção
que atravessa os becos escuros do centro
que corre apavorado contra o vento
que varre frio a Av. Goiás abandonada
a cidade desacordada
tentando se salvar de si mesmo


Eu sou aquele homem-batráquio
que acreditou no vôo do sapo
e um dia tentou voar
mas se esqueceu que sapo não voa
que anuros foram feitos para pular:
dei meus pulos,
fiz meus corres,
engoli moscas e sapos
atravessei alamedas e paços
ainda tentando encontrar
alguém que tenha o mesmo DNA que o meu

domingo, 3 de março de 2013

desterro



como deflagar um talvez
de algo que não se fez?

como fugir da rendição
dos poros em arrepio?

imaculado fato profano
ainda não concretizado
faz perder as rédias
de um suspiro insustentável
de um desterro perdido
entre tantos ais.

sábado, 2 de março de 2013


O MONSTRO DA GARAGEM

Todo dia ela saia para trabalhar no mesmo horário. Acordava cedo, invariavelmente com sono, com aquela vontade de ficar na cama mais cinco minutinhos. Aliás, assim fazia: colocava o celular pra despertar e o tal “soneca” ficava tocando até que não dava mais pra adiar. Banheiro, xixi, banho, roupa, sapato, cabelo, batom, café e chaves. Pronto. Estava preparada para enfrentar a rotina da repartição.
Naquele dia, como em tantos outros, seguiu o ritual, mas acabou derramando café na blusa nova e até fazer a troca, já estava atrasada.
Morava no terceiro andar de um prédio de 10 andares. O elevador velho e gasto lutava com engrenagens enferrujadas que além de serem lentas, faziam um barulho infernal.  Preferiu correr escada abaixo. Quase tropeçou nos primeiros degraus, mas finalmente chegou até a garagem, que estranhamente estava toda no escuro.
– Ah meu pai, e agora? Pensou em voz alta. Ficou parada.
A garagem era gigantesca. Mantinha uma iluminação pálida eternamente funcionando. Nem uma brecha de sol ou qualquer luz entrava por lugar algum. Não tinha janelas, nem portas. Os portões de entrada e saída abriam e fechavam por ordem de um controle remoto, que ela deixava dentro do carro.
Entre a escada e seu carro havia inúmeros obstáculos: a parede dos elevadores, as pilastras de sustentação, a ordem caótica do estacionamento. Ela precisava de luz.
“Nem uma lanterninha, nada. Ah, já sei, o celular!”, falou consigo mesma. Deu alguns passos procurando na bolsa que levava a tiracolo. Bolsa grande, cheia de necessidades femininas: pente, maquiagem, absorvente...e nada do celular que se perdia entre tanta coisa.
Parou de andar. Procurar o celular no escuro, naquela bolsa que mais parecia um buraco negro, não estava dando certo. Praguejou:
– Merda.
Foi ai que ouviu um barulho estranho vindo lá do outro lado da garagem.
– Tem alguém ai? Gritou. Ei estou aqui perto da escada, tem alguém? Socorro, falou em tom de brincadeira.
Nenhuma resposta. Apenas um farfalhar como se alguém amassasse um papel.
– Ei, você...chamava já não achando tanta graça da escuridão e do silêncio que não respondiam nada.
– Finalmente! Exultou sorrindo ao puxar o celular da bolsa. Acendeu a lanterninha que havia lá. Na verdade um aplicativo que ela insistira em instalar. Uma luzinha que dava para pelo menos iluminar o caminho sem tropeçar até o carro.
Mais uma vez um barulho. Mais um papel amassado.
Apurou o ouvido.
– Ei! Chamou corajosamente mais uma vez. Estava começando a ficar com medo e congelou de pânico quando pode ouvir que alguém estava correndo em sua direção.
Levantou o celular com a luz fraca à sua frente, girou para todos os lados e não conseguia ver nada nitidamente. Apenas sombras. Gritou mais uma vez e ninguém falou nada.
Estava inquieta com aquilo. O coração já disparava. Nenhum vizinho desceu as escadas, ninguém chegou pelo elevador. E a luz não voltava.
Tomou o caminho até seu carro, que ficava um pouco afastado dali. Conseguiu fazer as manobras para se desviar das pilastras e dos veículos mal estacionados. De longe avistava o carro. Apressou o passo e mais uma vez o barulho. Desta vez estava perto dela. Não vinha mais do outro lado da garagem, mas de logo ali atrás. Mais uma vez ela parou. Estava suando frio, girou o celular novamente para todos os lados. Mal respirava. Neste momento a luz do aparelho apagou. Nervosa tentava religar a luz fraca, os dedos tremiam, deixou o celular cair.
– Merda, merda, merda, repetia sem parar. Tateou o chão e pode sentir o celular. Pegou e finalmente conseguiu acender a luz novamente.
Levantou devagar tentando ouvir os ruídos. Jogou a luz para frente e pode ver escondida atrás de um carro uma sombra que não estava lá antes. Não sabia se saia correndo ou ia em direção a tal sombra. Decidiu ir até a sombra. Iluminou o cantinho entre a parede e o velho carro da vizinha do 405. E foi ai que viu. No princípio pensou que fosse um animal, ou uma criança, e conforme foi se aproximando seus olhos pareciam não acreditar. Ela estava em pânico. Viu que na verdade era um monstro saído dos piores pesadelos dela.
Gritou e quase deixa o celular cair novamente. Girou em direção ao seu carro e saiu correndo. A criatura tinha uma espécie de conjunto de sete pernas e patas. Disformes. Como se uma pessoa se contorcesse em uma manobra circense e os pés e mãos ao contrário servissem de sustentação. A monstruosidade tinha uma boca larga cheia de dentes afiados. A pele não era humana, era brilhosa, gosmenta, cheia de feridas. Cada passo que dava era como se todos os ossos se quebrassem ao mesmo tempo. Era uma criatura horrenda. Parecia ter sido revirada do avesso.
Enquanto ela corria para o carro, a bestialidade tomava velocidade atrás dela. No começo se moveu lentamente, emitia um som gutural. Aos poucos foi evoluindo para uma corrida e chegou a ficar próximo aos calcanhares da mulher. Corria freneticamente, se jogando entre os corredores e os carros.
A mulher gritava, o monstro gritava mais ainda. Finalmente ela conseguiu abrir a porta do carro e se jogou lá dentro. Por pouco, muito pouco a criatura não entrou com ela. A fera se espatifou na porta do carro. E ficou furiosa. Ia contra o carro com garras e dentes, tentava quebrar os vidros, babava de ódio. Ela lá dentro sem ação, no escuro, sem fôlego, estava descontrolada e ainda gritava. Foi então que num momento de lucidez ligou o carro. Deu ré, bateu em outros três veículos e foi em direção a saída da garagem. O monstro caiu no meio do caminho, ela passou por cima. Sentiu o baque quando esmagou aquela pele nojenta.
Conseguiu apertar o controle remoto para sair do estacionamento. Lá fora o dia estava claro e normal. A vizinhança se preparando para pegar ônibus, outros passando e estranhamente a vizinha do 405 chegava no prédio pela outra pista acenando de dentro do carro. Um sorriso enigmático.
– Mas, como ela saiu? Eu estava sozinha na garagem. Ela não passou por mim...como pode? Quer dizer, e aquele monstro? O que era aquilo? Se perguntava.   
Ela estava atônita. Estacionou de qualquer jeito assim que se acalmou. Ainda dentro do condomínio, do outro lado do edifício, desceu do carro e vomitou. O porteiro correu para ver se ela estava bem.
– Sim, estou bem. Eu acho. Aliás, eu preciso de ajuda sim. Lá na garagem, lá dentro, eu acho que eu matei...eu matei...atropelei....
– O quê?  Perguntava nervoso o porteiro.
– Não sei o que era. O senhor pode me acompanhar? Estava escuro, não tem luz lá.
– Não sei o que a senhora está falando. Eu acabei de vir de lá e não tem problema nenhum com a energia. Inclusive a senhora saiu de lá pelo portão, não foi? Ele funciona com energia elétrica, tentava explicar o porteiro.
– Como? Eu não estou louca, dizia ela mais para si que para o funcionário incrédulo.
Foram os dois em direção a tal garagem. Pegaram o elevador na portaria, desceram ao subsolo e quando a porta do elevador se abriu lá estava a garagem intacta, iluminada, movimentada com a vizinhança dando seus bons-dias e manobrando seus carros mal estacionados. Ela saiu do elevador apavorada.
– Mas o que é isso? O que está acontecendo?
Foi em direção à própria vaga e tudo estava como deveria estar.
Correu até a parte onde atropelara o monstro e lá não havia nada. Sequer uma mancha de sangue no chão.
– Mas eu vi, eu ouvi...eu...ah, meu Deus, chorava a mulher desconsolada.
– Calma. A senhora precisa de ar. Vamos subir, falou o porteiro.
“Não, eu preciso achar...mas achar o quê?”, pensou ela.
– Está bem. O senhor se importa de me deixar ver o filme do circuito de segurança? Pedia, quase implorando.
– Vou chamar o síndico.
Foram os três para a sala pequena onde ficava a parafernália da segurança. Olharam a fita, e sim, lá estava ela descendo a escada. Todas as luzes acesas. No filme ela parou, mexeu na bolsa e pegou o celular. Estranhamente colocou o aparelho na frente dela mesma como se iluminando o local que já estava iluminado.
Foi em direção ao carro, parou em frente à vaga vazia da vizinha do 405 e saiu correndo. Entrou no carro rapidamente, como se tivesse em pânico (estava em pânico!) deu partida e os três carros em que havia batido não estavam lá. No filme as câmeras mostravam uma moradora num ato comum indo em direção à saída e abrindo o portão normalmente.
–Só isso? Perguntou o síndico.
– Não, espera, não tinha luz, e sim, eu vi, vi um animal, um monstro... estava atrás do carro do 405. Vocês têm que acreditar em mim, suplicava.
Mas agora nem o carro aparecia na filmagem, nem o monstro. O porteiro e o síndico se olharam. Não estavam acreditando em uma palavra do que ela dizia.
Ela começou a chorar. O síndico a acompanhou até a casa dela, arrumou um copo com água e perguntou se ela queria que chamasse alguém. Ela só conseguia chorar, estava desorientada. Respondeu que não precisava avisar ninguém. Não tinha mesmo ninguém para chamar. Deitou-se no sofá e adormeceu entre lágrimas. O síndico foi embora, fechou a porta devagar imaginando o que aquela coitada tinha bebido logo pela manhã.
Ela acordou com o apartamento envolto pela escuridão. Olhou no relógio e viu que eram três horas da tarde. “Só três horas? E tão escuro...” foi esse o seu primeiro pensamento.  O segundo pensamento foi que estava faminta. Levantou do sofá deu dois passos em direção ao interruptor para acender a luz quando do corredor veio um barulho estranho, como se alguém amassasse uma folha de papel...

sexta-feira, 1 de março de 2013

Se ser é

Ser grosso, mas doce
é adorável
Porém doce, mas grosso
é detestável
E
Se adorável, sincero
é solitário
Se detestável, fútil
é celebridade
E
Ser solitário, rico
excêntrico
Ser celebridade, pobre
espúrio
Sei que sei menos
dia a dia.
Se ser é
foi
ou seria
Me entedia.