quarta-feira, 21 de setembro de 2016

Nau Lua















Ensina-me uma canção
Para despertar a lua

Desencantá-la do seu sono
Imerso na densidade das esferas

Componha uma canção
Isenta de pecados

Dissolva-os com a saliva
Do nosso amor trocado

Componha uma canção
Com notas soltas
E acordes de jasmim

Que seja doce e,
Dissolva na boca
Das noites lilases

Na transparência do negro azul mar
fim

Afete
O amor
O amargo
O denso
O fraco

Clareie a lua
A sua canção

O afeto
O gosto
O som


De cifra 
Astro irradiado

segunda-feira, 19 de setembro de 2016

Svalbard, I Love You

Durante seis meses, tive a oportunidade única de morar na cidade mais ao norte do mundo: Longyearbyen, no arquipélago de Svalbard. Graças a um convite muito especial do explorador do ártico Chicco Mattos, consegui passar esse tempo de minha vida em um lugar ímpar.

Dona de uma natureza exuberante, com um clima subpolar, Svalbard possibilita aos seus visitantes e moradores a chance de testemunhar o sol da meia-noite em seu verão, e a noite polar em seu inverno. Durante a fase escura, vi um dos maiores espetáculos da natureza: a Aurora Boreal, e suas luzes verdes a dançar no céu estrelado do Ártico.

Além do frio que senti, – com direito a um início de frostbite em meu rosto - vi uma natureza única de animais que sobrevivem ao frio intenso, e a beleza de aves que migram todo o ano para Longyearbyen. Vi a vida, através das pequenas pétalas das flores, que se multiplicam para tentar sobreviver ao verão a embelezam ainda mais este lugar, que agora faz parte de minha história, e que ficará para sempre no meu coração.


 Longyearbyen, cidade mais ao norte do mundo
 Rena típica de Svalbard no inverno
 Eskerfossen, cachoeira congelada
 O transporte mais comum de Svalbard no inverno: o snowmobile
 Aurora Boreal em Adventdalen, início de março
 Tempelfjorden
 Uma barraca estilo indígena, clareando o branco da paisagem.
 Aves migratórias - o fim do inverno chegando
 Navio Nordstjernen, final de agosto
 Natureza viva sobre o gelo
 Eu em Magdalenefjorden
 Uma foca solitária, repousando sobre uma pedra
A estátua de Roald Amundsen, o maior explorador norueguês, na localidade de Ny-ålesund

domingo, 18 de setembro de 2016

a recíproca é verdadeira



eu sinto o blues o tempo inteiro,
todo dia.[1]
é minha sina, nasci com má sorte[2], dizem,
ao menos foi o que uma cigana disse a minha mãe[3]; 

nasci com o blues e pronto[4],

minhas 24 horas do dia cantam os blues
incansavelmente,
e eu canto junto.

afinal, se os problemas fossem dinheiro,
eu juro que seria um milionários[5];
como não posso perder o que nunca tive[6],
eu continuo bebendo[7] e esperando o sol bater na minha porta
algum dia[8],
pois os tempos são difíceis onde quer que você vá[9];

porque, sabe, é tão difícil amar alguém
que não ama você[10],
até porque ninguém me ama, a não ser minha mãe,
e olhe que ela pode estar bincando também[11],
mas logo eu estarei morto e dormindo a sete palmos do chão[12];

pois bem, é tanto blues na cabeça que
não sei se sou eu que sugo o blues,
ou se é ele quem me suga;
se eu o respiro ou se é o blues
que me re(in)spira.

André Espínola



[1] B. B. King – Everyday I Have The Blues
[2] Albert King – Born Under a Bad Sign
[3] Muddy Waters – Gypsy Woman
[4] Memphis Slim – Born With The Blues
[5] Albert Collins – If Trouble Was Money
[6] Muddy Waters – You Can’t Lose What You Never Had
[7] Pinetop Perkins – I Keep On Drinking
[8] Big Bill Broonzy – Trouble In Mind
[9] Skip James – Hard Times Killin’ Floor
[10] Son House – Death Letter
[11] B. B. King – Nobody Loves Me But My Mother
[12] Howlin’ Wolf – How Many More Years

sábado, 17 de setembro de 2016

Vida'mor

Quero a poesia madura
fruto recém colhido do pé
sabe-se lá o que é

não quero rascunho, esboço, nem tristeza
quero a palavra suculenta
antes que o fruto apodreça

quero as estrelinhas do teu corpo
afago de brisa
e sopro

quero a loucura escaldante
comer a polpa, a carnadura
a infinita tessitura do instante

quero a saliva
o sabor-a-ti, o orgasmo revigorador
antes de mais nada

quero a vida e o amor

sexta-feira, 16 de setembro de 2016

Chuva de canivetes

Pensava em um rumo
todos ali esperavam

todas as gotas
todos os minutos
todos ansiosos

aos poucos
eles iam embora
sozinhos
casais
ou grupos

tão escuro
tão frio
tão nervoso

estava na parada
seu ônibus
nunca veio.