terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Encontro

 
fonte: helix-ifrog

Eu não chamarei o teu nome
enquanto fores fogo
futuro.

Não acalmarei tua mão na minha
... se o teu toque
estiver distante.

É preciso, amor,
que arrisques a perda,
a ausência
e a tortura.

Queres o meu tempo
em tempo contigo?

Dê a mim o teu pensamento
o encontro
e o destino.
 

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Convidado André Anlub

Nossos Litígios

Pelos nossos próprios litígios
Tentei organizar nossas vidas
Apagando insensatos vestígios
E acendendo e excedendo as saídas.

No doce ninho, que mesmo em sonho
Onde criamos rebanhos, rebentos
Em águas límpidas que fazem o banho
Depurando, em epítome, nossos momentos.

Amontoando em vocábulos incertos
Vejo e escrevo, em linhas tortas, n'alma
Optando por esse amor na justa calma
Nas brigas que expulsam demônios e espectros.

Mas na sensatez do amor verdadeiro
Vi-me lisonjeado por ser o primeiro
O real, fiel e o ardente.

Sou o qual lhe agarra a unhas e dentes
Sendo o mais perfeito, da paixão, mensageiro
Andando feito ébrio a passos doentes.

Mesmo se somassem todos os números e datas
Secassem todas as águas do planeta
Encharcando sua face que no ápice da tormenta
Sempre responde com lisura imediata.

O ardor do âmago do seu ser
Acabou escrevendo minhas linhas
Nesse bem querer de minhas rinhas
Só, e mesmo cego, posso lhe ver.


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sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Em tempos de redes sociais

A notícia de sua morte teve amplo destaque nacional.




Foi listada por seis horas nos tópicos mais comentados do Twitter...

... compartilhada durante onze horas e quarenta minutos no Facebook.

Meses depois apareceu por dois minutos na Retrospectiva do ano.

Por fim, sua biografia apareceu em treze linhas nos livros escolares.



E nada mais.

Buquês de Rosas Vermelhas

Olha a mulher que se acha feia.
Em casa, sozinha
numa noite de sexta-feira.

Uma taça de vinho
(é noite de sexta-feira).
No banheiro,
defronte o espelho,
a mulher que se acha feia
fita-se de frente e de lado,
brinda com seu reflexo
e sonha ver-se linda.
E sonha ver-se amada.

A mulher que se acha feia
reclinada na banheira.
Um livro e uma taça de vinho.
E o sonhar em segredo
com toques de dedos
que a conheçam tão bem
quanto ela se conhece.
Um breve tremer de pernas nuas.
Um gemido. Uma lágrima. Duas.
(a mulher que se acha feia, estranhamente,
chora, quando goza, o companheiro inexistente).

Gillette e uma taça de vinho.
A mulher que se acha feia,
com gestos bem calculados,
esculpe com todo o cuidado
os contornos dos pelos do púbis
que ninguém irá tocar.
E imagina ver no fluxo
dos jatos da jacuzzi,
surgindo dos pulsos,
buquês de rosas vermelhas
que ninguém jamais lhe deu.

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Crepúsculo

O Sol se pondo é belo e triste e cor
E a nuvem mancha o manto azul que vai
Adormecer fechando o olho que cai
Tal qual quem presta a um deus algum favor.

E quando o Sol bem lento ao largo for
Cumprir sua sina e assim da cena sai,
Se instala o escuro, o breu, o horror! Ai, ai...
É a hora então que forte vem a dor.

E o medo salta grave e treme o senso,
Mas não da luz que falta e gera o escuro
E sim da solidão: pavor intenso.

E busco a força lá no fundo, eu juro!
E num esforço grande, enorme, imenso,
Meus toscos erros outra vez aturo.

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

in(constante)



minha fase larval
causa fobia

numa simetria axial,
arranco das asas
poesia.

fugir da crisálida
é a minha natureza,

e por ser tão polifásica
vivo o efeito borboleta


Autora: Lena Casas Novas

sábado, 21 de janeiro de 2012

divirtam-se!

Acordei cedo e vi o papel em cima da mesa. Fiquei maluco, porém deixei para resolver a questão mais tarde. Havia uma reunião agendada para o primeiro horário na agência. Tratava-se de uma campanha publicitária para um suposto negócio da china, interessante para uns gringos. Caso desse certo, a expectativa era a de se dobrar as receitas. Pus uma camisa e uma calça jeans de qualquer jeito, já que estava atrasado, escovei os dentes e não deu tempo de fazer a barba. No trânsito, enquanto aguardava o farol, notei uma mancha de pasta de dente na camisa, mas com um pouco de saliva consegui tirar.

No meu modo de ver a reunião havia sido um sucesso, mas só dentro de uns dias iríamos receber a resposta se o negócio seria de fato fechado ou não. Cheguei pra casa ao meio da tarde e, lá estavam: Lito mordendo o lábio em frente à escrivaninha anotando qualquer coisa e, o Bobby, filho da puta, sentado ao sofá, que fica de costas pra porta de entrada, assistindo vídeo pornô na tevê e batendo punheta, na maior cara de pau, como se nada tivesse acontecido. Esses moleques são foda, só sabem fumar maconha e fazer isso da vida, e ainda se acham gente grande. Fui até ele sem que me percebesse e dei-lhe um cascudo exclamando que porra de merda era aquela. Ele se desconcertou todo, recompôs-se e, então, disse:

“é um filme pornô”

“não me refiro a isso, tonto. estou falando de outra coisa”, tirei do bolso da camisa o papel com o escrito e pus-lhe diante o rosto

“ah, a parábola da vaca. ainda bem que achou. fui eu que escrevi e...”

Ele merecia outro cascudo, e foi o que eu dei nele.

“não tem ‘e’, nem ‘b’, quero que me diga que porra é essa e o que o nome do Lito tá fazendo ao lado dessas palavras infames... que história é essa, afinal? E até onde isso aqui foi parar?”

Ele fez uma cara de quem se fodera. Fiquei com pena, devo ter pegado pesado com o garoto. Ensaiei iniciar uma conversa de maneira calma, pra saber o que de fato acontecia, porém então ele disse:

“bom, senhor P., o lance é que o Lito se envolveu numa baita enrascada, tá sabendo? Isso aí é um argumento, a fim de justificar uma determinada coisa que aí o Lito vai decidir se irá contar ao senhor ou não, agora que já sabe sobre a vaca”

O pior de tudo é que o filho da puta sabia falar. De qualquer maneira, continuava sem entender nada. Que raio de coisa era essa que havia acontecido e eu não sabia? Que porra de história era essa a da vaca?

Olhei então para o lado e o Lito estava maluco, aspirando fumaça de uma bituca que queimava dum cinzeiro, enrolando o cabelo com o dedo e segurando uma caneta que não escrevia nada, tudo isso ao mesmo tempo, concentrado com os ouvidos colados nas caixinhas de som, que emitiam uma espécie de rap moderno cheio de efeitos com sintetizadores, dando trancos com a cabeça conforme os beats, lembrando qualquer espécie de maluco fugido do hospício. Até que era maneiro, mas agora já era, ele estava pego!

“que história é essa, Lito?!”, exclamei em sua direção.

O bicho se assustou, deu um pulo da cadeira e nem precisei dar-lhe o cascudo, bateu com a cabeça na estante da impressora que voou longe e se espatifou no chão. Cacete! Não fazia nem um mês que havia comprado. Sem contar que ainda me restava mandar concertar o computador que o Bobby, retardado, fez o favor de queimar enquanto o usava em dia de chuva.

“Quê?”, foi o que ele disse

Deixei pra depois a bronca que iria dar pela impressora, e insisti:

“que história é essa?!”, levantando o papel

Recolheu o papel e se pôs a ler. Coçou a cabeça, passou a língua pelos lábios e depois mordeu. Esse é meu filho, pensei. Manteve-se pensativo enquanto lia. Andou de um lado a outro da sala. Resolvi que daria esse tempo. De repente parou e fez uma careta, como aquelas que fazem os investigadores. Foi até o cinzeiro onde havia o cigarro, mas não fumou nada, pois já estava apagado. Percebi seu espírito aflito. De repente, à medida que seus olhos transcorreram as últimas letras, uma mistura de felicidade e êxtase tomou conta do semblante dele. Então dobrou o papel e, antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, apontou pro amigo, o Bobby, que voltava do banheiro, e disse:

“Esse moleque é doido! Esse moleque é doido, mas esse moleque é um gênio!”, deu um pulo, acho que de alegria, e saiu correndo pro quarto.

Eu já não entendia mais nada. Olhei pro garoto Bobby, que parecia um zumbi sentado ao sofá, e fiquei no aguardo de alguma informação. Ele não disse nada. Perguntei, então:

“será que dá pra você me explicar qual é o diabo?”

O desgraçado manteve-se calado. Eu não quero causar polêmica, não, mas alguém arriscaria me dizer o que de fato anda acontecendo com essa garotada? Desconfio que estejam ficando meio birutas. E foi aí que o Lito, filho de uma puta, saiu do quarto com aquele baita baseado na mão. É um filho da puta mesmo, pensei. Sempre dá um jeito de mudar o assunto quando lhe convém.

“Já chega!”, esbravejei, “hoje você tá pego, e isso aqui não é a casa da Maria Joana!”

Ele ficou com cara de paisagem frente a minha atitude.

“você estudou o quê esses últimos dias? O que sabe sobre a revolução da biotecnologia molecular? Já procurou conhecer seus genes hoje? Enquanto você tá aqui, eles tão te fodendo em algum lugar, subindo à suas custas, usando o seu crânio como degrau. Se não ficar esperto, tu vai pra roça. É isso o que você quer? Ir pra roça? Passar o resto dos seus dias miseráveis plantando alfaces? Comendo batatas? Deve ser isso mesmo o que você quer, só pode ser. Isso aqui é a América, filhão, um leão por dia!... Porra, tu só faz besteira! Vá pro teu quarto ou, se preferir ir pra rua, vá, pois só te quero ver de novo quando souber qualquer coisa sobre os seres híbridos!”, acrescentei.

Às vezes temos que situar a molecada, senão pensam que tudo é patuscada, e a vida não é feita somente disso. De qualquer maneira, eu o conheço. Não diria nada mesmo. Apenas fez o que eu pedi para ele fazer. Dirigiram-se até a porta.

“E se você pensa que ficou por isso mesmo o lance do filme no sofá, moleque, está enganado, ouviu?”, adverti o outro.

Vaquinha magra... vê se pode. Realmente estava sem tempo pra nada aquele dia. Depois revi minha atitude e, admito, fui duro demais. Fiquei com enorme peso por ter posto os garotos na rua. De qualquer maneira, a minha carreira estava pela frente. Descobriria, mais tarde, que o negócio com os gringos não teria dado certo.

Inusitado


O novo chega de repente.
De maneira inusitada.
Quebrando a vidraça da janela,
Subindo pelas paredes...
Ignorando as escadas.
O novo chega com o corpo ausente.
Mas, a alma estilhaçada.
E, refaz-se juntando os pedaços
De outras almas que encontra na estrada.
Corpo e alma, vidas novas...
Novos rumos, rastros indecisos.
Não sabe aonde ir,
Mas é preciso.

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Convidado Rui Werneck de Capistrano

Ficsonho

Na saída da Biblioteca Pública, a menina-moça abraça amorosamente um livro contra o peito em flor.
Que livro não gostaria de ser um garotão sarado nessa hora?





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Rui Werneck de Capistrano, de Curitiba, é autor de NEM BOBO NEM NADA, primeiro romancélere brasileiro. Contato: rwcapistrano@gmail.com
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terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Pisciano

sou um homem sem vontades
que sente saudade
das vontades
que nunca teve.

o que existiu em mim
foi como devaneio,
que ao sinal do
primeiro passo,

fechasse os olhos
e morresse.

André Espínola

Mensalmente

Há um vulcão escondido
De onde brota sangue grosso.
Forte, quente e vivo.
Lágrimas de algo que foi morto.

Ele jorra aos montes.
Escorre entre as minhas pernas
Limpando a dor ou o amor antigo.
E muitas vezes, suja o meu vestido.

O sangue se esparrama pelo chão,
Não faz cerimônias ou concessões
Apenas me afoga em seus braços lânguidos.
E reafirma algo que tento esconder.

Não há fruto, não há semente
Nem espera ou desespero
Apenas uma mulher que colore
De vermelho, o banheiro.

domingo, 15 de janeiro de 2012

A escuta

onde a voz aponta
e o dedo alcança
sangro esta palavra
em riste, como peito
em lança sem escudo
como água em pedra cristalina
como o rugido do fogo
silêncio de horizonte sem auroras
bocejo de luas amanhecidas
solares sorrisos de criança

nos lábios, as digitais
olhos viajam repletos de sonhos e sílabas
nas falanges distais, o início

e quando o grito rompe
o eco das estrelas
calo
contemplativo
a escutar o ruflar do universo
pulsando infinitos

(Celso Mendes)

sábado, 14 de janeiro de 2012

A Pescadora de Luas

(Sonia Cancine)
.

Eternizam-se na memória
- no embalo do vento -
Absorvidas pelo nó sorvido
- com gosto de maçã -
Emoção em gotas cítricas e hortelã.

Das pupilas e das contas d’água
- do verde mar de seus olhos -
Da bruma espuma, nódoas de solidão
O vinho escorre nas veias, rompendo o chão.

Arranco calhetas e cascalhos
Do ferrolho de meu peito
- sou pescadora de Mim -
Húmus mudos
Fragmentos que perdi...

A Luz espalha o seu aroma
Na Terra que fenece
Irrompe em tempos estranhos
Onde se tinge de sangue
Precipita-se ao Sol e
Só se detém, ao amanhecer.

Vislumbro o oceano
- no marejar de meus olhos -
E ao trazer a alma azul do mar e do céu

Eu chorava ao voltar para a Terra.

O imaginário da Lua inspira-me
- a mulher guerreira -
No fundo do lago ou de Yaci...
Qual espelho da Lua, na face refletida

O antes e o agora
- pescadora e cavalgante -
De águas e terras distantes
Neste agreste mundo aquoso

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Dúvida


  

Muitas coisas me intrigam nessa vida. Coincidências são algumas delas. Eu sempre pensei em escrever, na verdade, eu tenho escrito faz tempo, escrever me dá uma boa sensação de liberdade. Algumas semanas atrás, um amigo me perguntou se queria escrever para o blog, que coisa legal. E o mais legal, eu não disse absolutamente nada e o dia escolhido para eu começar foi 13 de janeiro. Coincidência? Eu nasci em 13 de janeiro. Mas tudo bem, não vou escrever sobre coincidências. Não hoje.

Dúvida. Sim, na dúvida, vou escrever sobre ela mesma. Embora a dúvida esteja sempre viva para o próximo pequeno segundo à frente, vivemos amarrados à certeza. Qual certeza? De quê? Tanto se pesquisa, tanto se estuda, mas quanta coisa ainda a ser respondida e quantas respostas que criam novas perguntas. Certeza mesmo só do fim, ou você acha que não? Não?

A verdadeira sabedoria está na dúvida e não na certeza. Aristóteles escreveu sobre isso bem antes desse meu texto. Uma criança de poucos anos que não cabem em uma mão cheia pode fazer simples perguntas para deixar muito pesquisador chateado. Veja no exemplo uma conversa séria de pai para filho que presenciei recentemente:
- Pai, por que os dinossauros não existem mais?
- Filho, veio uma bola de fogo do céu e queimou tudo e eles morreram.
- Não entendo o porquê do papai do céu mandar a bola de fogo e eles morrerem! Por quê?
Sim, é um exemplo infantil, mas dúvida genuína é sempre infantil, acabou de nascer. Em seguida ela nos move ou nos paralisa. Ou então fingimos estar dominando a dúvida só enquanto podemos ter certeza da sua resposta. Não, não estou falando de dúvida que o Google pode responder, estou falando de dúvidas sérias. 

Faça uma lista das suas dúvidas e certezas na sua vida, coisa rápida. Seja sincero. Não fique em dúvida, mesmo que sua lista precise estar escondida dos outros. Não confunda essa reflexão com irresponsabilidade, ou seja, vou largar tudo e viver na dúvida. Faça a lista. Descubra suas dúvidas. Elas podem te dar certeza de algumas boas coisas! 

Como encontrar um retorno? ou Sobre o entendimento

 
O carro está parado e desligado.
Ela está sentada no lugar do motorista, ele no banco do carona.

ELE: Tenho que ir.
ELA: Tem certeza?
ELE: Acho que a gente tá num ponto sem volta.

Ele solta o cinto de segurança. Ela desvia o olhar. Tenta se ajeitar, mas o banco não ajuda.
Tampouco o cinto.
Encontra com o olhar o retrovisor e permanece olhando fixamente por ele. Tenta ver alguma coisa que não consegue enxergar.

ELA: Como eu faço pra sair daqui?
ELE: Segue em frente. No fim da rua, tem um retorno.

Ele não sai do carro. Ela não liga o carro. Parece um impasse.

ELE: Você consegue ver pra onde a gente vai?
ELA: Não sei.

Ela decide ir embora.
Está sufocada, precisa sair daquele lugar. Tenta ligar o carro, mas o carro não liga. Ele ignora a tentativa dela de ligar o carro.

ELE: Pois é. Também não sei.
ELA: Não quero que acabe.
ELE: Nem eu. Mas acho que você não tá pra valer.
ELA: Como assim?
ELE: Acho que a gente podia ir adiante, mas não vejo você abrir mão de nada.
ELA: Como?
ELE: Desculpa, vou reformular. Acho que você podia abrir de algumas coisas.

Ela olha pra ele.
Pensa o que ele deve estar sentindo. Tenta adivinhar. Sente que o esforço é em vão.
Fala, bastante incisiva.

ELA: Mas eu já abro mão de muita coisa. Pode ter certeza.

Silêncio.

ELE: Não quis te ofender.
ELA: Sei que não.
ELE: Tô falando sério.
ELA: Eu sei.
ELE: Quero voltar.
ELA: Eu também.
ELE: Mas vai ter que ser diferente.
ELA: Eu sei.
ELE: Tudo. Completamente.
ELA: Completamente diferente é ódio. Não quero te odiar.

Silêncio.

ELE: Sabe que eu não falei isso.
ELA: Você disse completamente diferente.
ELE: Eu sei. Mas você sabe o que quero dizer.

Ela não sabe.
Não faz a mais vaga ideia. Pensa consigo o que seria diferente. Amar mais parece impossível. Mais dedicação, também. Não sabe o que ele quer dizer. Nem o que sentir.
Não sabe amar mais. Também não sabe amar menos.

ELE: Você entende o que quero te dizer?
ELA: Entendo.

Não, ela não entende.


quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

venda de produtos do BdE



O Bar do Escritor, a Factotum e a Incessante Presentes firmaram parceria para vender e enviar os produtos do BdE. Por enquanto, estão disponíveis apenas as três antologias, mas em breve teremos camisetas, canecas, ímas de geladeira, copos, lápis, canetas, borrachas, cadernos de anotação e outros mais. Aguarde. E conheça:

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Convidada Roberta Doelinger


Tempo

Na linha da vida
 
Onde o tempo é tudo
 
Onde o tudo é nada
 
Somos simples passageiros
 
Desta triste
 
E longa jornada

 
Já sabemos pois
 
Que o tempo é veloz
 
Devorador do amor
 
E da sorte
 
Carrasco da vida
 
E mestre na morte

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Roberta Doelinger

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segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

A LOURA DO CARA


A LOURA DO CARA

Rua Visconde de Pirajá com Vinicius de Moraes
Ipanema
Três da madruga
Um carro parado
Dentro uma loura gostosa discute com um cara
Posso ver claramente no meu telescópio
Seu decote
Sua minissaia
Suas cochas
Tenho uma ereção
Saio da janela
Sirvo-me uma dose de uísque
Meu pau não abaixa
Aperto um verdinho
Dou vários catrancos na erva
Meu pau não abaixa
Volto pra janela
O carro ainda está lá
Miro meu telescópio pra gostosa
Eles ainda discutem
Penso várias coisas
Ela deve ter o traído e ele descobriu
Vadia deliciosa
Meu pau não abaixa
A loura da um tapa na cara do cara
Com certeza ele descobriu que foi corneado
Ela sai do carro batendo a porta, com raiva.
Passional
O cara do carro vai embora
Caralho, ela é muito mais gostosa em pé.
Desisto do telescópio
Olho a olho nu
Da minha janela constato suas curvas
Sua minissaia preta colada ao corpo oferece-me sua bunda
Seu decote dourado serve-me suas tetas siliconadas
Meu pau não abaixa
Lá está ela, abandonada, andando de um lado pro outro.
Desfilando suas carnes pra mim
Dou um baita gole no uísque
Um tapa no bagulho
Ela me vê
Pegou-me de bagulho na mão
A vadia ri pra mim
Fico imóvel na janela
Ela grita:

- Posso subir e dar um dois aí com você?

Não acredito
Continuo imóvel na janela
Ela grita de novo:

- Tô falando com você

Mando-a subir
Meu pau não abaixa
Ôôô... Sooorteee...
Em minutos a loura estará no meu apartamento
Crio um clima à meia luz
Deixo a vista uma garrafa de uísque e um paco de maconha
Ela toca a campainha
Abro a porta e ajeito a pica
Que visão
A cadela vai direto ao meu telescópio e pergunta-me:

- Você espiona muita gente com isso?

Respondo sim
Ela continua:

- Gostou do que viu dentro do carro do meu namorado?

Respondo sim
Ela não para de falar:

- Aquele otário acha que eu tô sempre dando pra outro, acredita?

Eu tenho certeza
Respondo não
Ela senta no sofá, cruza as pernas e ascende um cigarro.
Cavala
Em pé na porta eu posso ver bem
Ajeito a pica e fecho a porta
Ela olha pra minha pica e da um trago no cigarro
Silêncio
Sento-me ao seu lado e aperto um baseado
Silêncio
Ascendo o verdinho e dou pra ela
Silêncio
Ela da um tapa no bagulho, depois outro, e mais outro.
De repente ela bota a mão na minha perna e fala:

- Isso não tá me dando onda, você tem cocaína?

Respondo não
Porra, a maluca grita-me na janela querendo fumar um, e agora quer cocaína, tô sentindo cheiro de merda.
Sem tirar a mão da minha perna ela diz:

- Vou ligar pro moto-taxi, tem problema?

Claro que tem problema
Respondo não
O telefone dela toca, ela não atende.
Batem na porta
Não estou esperando ninguém
Uma voz masculina grita:

- Eu sei que você está aí sua piranha, abre essa porta porra!

Calmamente ela olha pra mim, da um trago no cigarro, levanta, abre a porta, e vai embora.
Corro pra janela e vejo o mesmo carro na esquina, vazio.
Os dois saem do meu prédio e andam na direção do carro
Ainda a escuto falando pro cara:

- Eu te amo seu bobo, o Mauricio é viado, eu nunca te traí.

Meu pau não abaixa


Pablo Treuffar
Licença Creative Commons
Based on a work at http://www.pablotreuffar.com/.
A VERDADE É QUE EU MINTO

A VERDADE É QUE EU MINTO

domingo, 8 de janeiro de 2012

Celofânica


Meus dedos cansados
Deslizam
Cordas imaginadas
Pendem sobre abismos

Tensas

Dedilho com cuidado
Velocidade de dobra
Desfolho sonhos apressados

Penso catecismos

Conselhos didáticos
Vagueiam pelas cercas
Em vôos celofânicos

Tudo vão

Recolho as asas
Imensas dentro do alambrado

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Adágio Prestíssimo de Adalgisa Pitonisa




Zarabumbeia a zabumba em derredor do ataúde
A terra engole a prole
de Adalgisa
Esconjuros de ebós de mandingas de "viernes santo"
Um negro ancião estala a língua e os ossos
Socializando o fogo fluido engarrafado na fonte
O futuro é um gato preto com futum de pelo molhado
Jesus Fura-bucho masca mato e cospe cospe cospe
Mariposas em revoada (mariposas revoam?)
antecipam o eclipse vaticinado pelo velho
a barba cofia desconfiado nauseabundo e lúgubre
Se esvai o dia do augúrio mau

Adalgisa chora
Adalgisa grita
Adalgisa cai
A terra devoradora de "niños"
revolve
e rega

Desesperai, filhos do homem!

Adalgisa vê
a luz de Jesus
Adalgisa arrebata
o prateado revólver
cano boca cano boca
estrépito silêncio
sete palmos

dor pungente
finis
mezinha quente

Adalgisa sabia
os mortos não mentem.

Carlos Cruz - 28/07/2010

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Gripe Literária

Acordar gripado é terrível. Com a garganta inflamada e torcicolo então, aí é pesadelo. A constipação da gripe afeta o cérebro e o pensar, a inflamação das cordas vocais te deixa afônico e sem condições de se expressar corretamente e o pescoço imóvel, apontado sempre na mesma direção ilustra muito bem aqueles que não movem o seu pensamento, que não veem outros horizontes e são habituados só com uma visão de mundo.

Junte à isso estar editando um livro, fazendo uma monografia e estudando para provas finais. Punk, né? C´est la vie.

Aproveito que ainda é manhã madrugada e vou pagar contas na lotérica. A fila da manhã é melhor do que a da tarde e o danado do ar-condicionado não está ligado. Corria o risco de despertar a sinusite e aí é que a coisa teria tudo para desandar.

Cubro-me igual a um explorador antártico (São Shakleton, rezai por nós), com tudo a que tenho direito: blusas em dobro, gorro, um cachecol do tempo de criança, calças de moleton e pantufas. Não, melhor deixar esse negócio de pantufas só para dentro de casa. Vou de coturno. Por educação ao meu semelhante, caio na besteira de usar uma máscara clínica, daquelas de médico. Sou o último de uma fila de tamanho médio, recheada de velhinhos e aposentados. A senhora à minha frente fica me olhando meio de esgueira, meio assustada. Meu andar frankesteiniano e o tom apocalíptico dos telejornais podem ter alguma coisa com isso, deduzo. Tentando fazer uma brincadeira para animar o ambiente e diminuir seus receios, solto a máxima:

Rigidez cadavérica post mortem.

O resto da fila se abre em bandas dignas do Mar Vermelho. Sem graça com a graça que não deu certo, pago minhas obrigações e ainda faço uma fezinha. Vai que hoje é o dia?

Retorno ao meu espaço virtual, obstinado. No caminho pela cozinha, faço todas as receitas de chá que a família recolheu nos últimos trezentos anos. Enquanto as chaleiras apitam e o microondas solta faíscas, adentro o ciberespaço. Vou aproveitar que estou infectado para espalhar isso aos quatro cantos. Quero inocular este vírus em todos, lançar uma pandemia (que bem podia se iniciar aqui, em tupiquimlândia), atingir você do Msn, do Skype, do Orkut, do Facebook, dos três tipos de e-mail, dos sites e blogs afins, você que navega porque é preciso.    

 I have a dream! Na verdade, mais de um, mas é que a citação cai bem. Um deles é disseminar a novíssima (ok, nem tão nova assim) gripe literária. Aquela que não se trata com comprimidos ou drágeas, chazinhos da vovó ou infusões; mas com escritos reais, virtuais, ideias (com ou sem acento), incutir nos outros a vontade de ler, se informar, tornar-se crítico diante dos fatos que o cercam, que o fascinam, que o afligem.

Eu quero um País com “p” maiúsculo e que leia bastante, seja criterioso o suficiente, cidadão em suma, antenado com o mundo e cumpridor daquela velha promessa que citava o futuro.

E para isso precisamos de você. E de mim, das velhinhas das lotéricas, dos adolescentes irados, dos cidadãos desiludidos e daqueles sonhadores que ainda não jogaram a toalha, dos jogadores de futebol e das personalidades da tevê; das empregadas, dos varredores de rua, mecânicos e professores, independente da fé que professem, das...

Agora vou tomar um chá com oito mil comprimidos que minha mãe mandou avisar que estou tendo alucinações... Ou será que estou mais sóbrio que nunca?

 

P.S – Se alguém souber como arrumar textos em .pdf, a ajuda seria bem vinda... 

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

sol de janeiro e ano inteiro

no acalanto de sua chegada
descobriu-me mulher
giro em sua órbita
provoca em mim estações
e desconhece-me esfera

causou-me amanheceres meridianos
as belas horas brilharam aqui
vogaram tanto e como que declinaram
no desespero de seu poente
ah, meu amor, minhas dúvidas!

seus lábios queimaram os meus
fizeram juras que não podem cumprir
não sou júpiter ou urano
nem sou saturno e em segredo
trago seu anel no polegar esquerdo

meus olhos devotei aos dias
que choram durante a noite
é madrugada agora
sinto a frieza da solidão
um medo tão meu

obedeço a ordem que impôs
apertam-me suas margens
privam-me do seu calor
tento esquecer o que foi
todas as manhãs.

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Possuído


Eu quero um homem complexo
e cheio de marcas,
com erros sem volta nas linhas do rosto,
no corpo, na alma.

Eu quero um homem que pense
que ele não tem cura,
nem paz, nenhum porto
e que eu lhe seja uma nova aventura,
mudança de rumo, refresh na tela.

Em suma:
eu quero alguém
que ao sentir o meu cheiro,
meu beijo, meu sexo
se esqueça um pouco da vida
tão dura.

domingo, 1 de janeiro de 2012

início de ano


gastei as horas inúteis desses últimos dias relendo mulheres, do bukowski, e conhecendo dentes negros, do andré de leones. tb passei as vistas por “Douze preuves de l'inexistência de Dieu” ("Doze provas da inexistência deDeus"), este virtual, de Sébastien Faure, um anarquista francês da virada do séc. XIX. recomendo. 

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