terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Ton-sur-ton

Agora não quero falar
de coisas coloridas,
bonitas, delicadas,
de flores e borboletas.
Não quero falar de nada.
Hoje estou monocromático.

Por que não cantar o cinza
do asfalto e do cimento,
da gasolina e do diesel,
da poeira e da fuligem?

Por que não cantar o cinza
duro, frio, onipresente?
Os diversos tons de cinza
sobre cinza da cidade?

E uma vez cantado o cinza,
concreto armado e neblina,
e pintada a cidade em P/B,
aí, sim, falar de flores
e até, talvez, borboletas.
Sobre o fundo de cimento
não mais apenas bonitas,
mas praticamente perfeitas.

3 comentários:

Unknown disse...

É, singularmente, um poema reflexivo. Me faz pensar a cidade em que vivo e o mais das vezes, pouco vejo. E mais ainda me coloca em check-point: quando é que consigo olhar para a cidade, esse complexo orgânico, vivo, ao mesmo tempo amamentativo e desconstrutivo, quando é que consigo olhar a cidade com atenção e a necessária perspicácia para compreendê-la? Talvez um surto, sómente uma surto versificado para melhor vê-la, cidade, essa mulher bêbada em minha vida.

Flá Perez (BláBlá) disse...

quando a gente pensa que é uma homenagem ao cinza, eis que a coisa vira.
essa é bonita pela surpresa.

Glauber Vieira disse...

Além de estar bem escrito, é um belo texto.