sexta-feira, 9 de julho de 2010

O PUTRAFICA


O PUTRAFICA
uma ode para Demétrio Tenório de Mello


Demétrio Tenório de Mello
O domador de leões
Morou em Ipanema, na década de 80.
Era visto dirigindo uma Maserati conversível na orla do Rio
Placa de Punta Del Este
Entre outros carros
Jaguar
Porcshe
Lamborghini
Não eram dele
Demétrio foi o cafajeste no balneário carioca
Adepto das campanhas contra as drogas
Servia café a PMs em cafeteiras cheias de pó
Cheirava compulsivamente depois e antes
Batidas em seu apartamento
Não foram poucas
Não achavam nada
Em geral, iam embora melhores amigos.
Os PMs e ele!
Comparsas
Também, contrabandeava Rolex.
Trazia carros roubados do Paraguai
Tinha leões em seu apartamento
O qual era frequentado pela nata da bandidagem mundial
Falava pelo menos quatro línguas estrangeiras
Fluentemente
Sua casa era um bordel
Ele era o gigolô mor do Rio de Janeiro
E era cearense
Vivia na noite de Ipanema
Ipanema era o Leblon de hoje
Naquele tempo
Diria Hélio Luz
Ipanema brilhava à noite
É!
Ipanema brilhava por causa de Demétrio Tenório de Mello
Não durou muito
Com 38 anos de idade foi encontrado morto no Cosme Velho
Tiros nas palmas das mãos
Em seu corpo, onze pipocos fizeram a avaria.
Não sei por que tantos
Por vingança ou cortesia
Seu fim foi degradado
Ele era o homem que sabia demais
Na casa dele, foi descoberto um dossiê.
856 páginas
46 capítulos
Relatos de cizânia com uma modelo Paraguaia
Evasão de bilhões
Envolvimentos com o Cartel de Cali
Cartel de Medellín
Máfia italiana
Deputados
Senadores
Empresários
Traficantes
Economistas
Todos nomeados explicitamente
Membros da sociedade brasileira
Até o CENTAC 26 foi citado no dossiê
Serviço de informações
Movimentações de milhões de dólares
Vários bancos
Dezenas de negócios nebulosos
Roubos de diamantes
Empresas fantasmas
Enriquecimento ilícito
Além de menções a festas regadas à puta e pó
Deus não destruiria com fogo e enxofre essa Sodoma e Gomorra documentada
O caso foi arquivado por falta de evidências
Ninguém nunca foi punido
Aparentemente nada ficou provado
Só rindo!
A vida como ela é
Quando Demétrio mudou-se pro meu prédio, eu tinha 12 anos.
Fui seduzido por ele
Qual menino da minha idade não seria
Enquanto meus amiguinhos tinham heróis convencionais
Superman
Batman
Homem-aranha
Tantos outros
Eu só tinha um ídolo
Demétrio Tenório de Mello
O Cearense da Doze do Cano Cerrado
O Homem do Taco de Baseball
Rapidamente virei seu leva e traz
Eu esperava ser chamado ao seu apartamento
Ficar no meio das gostosas seminuas
Entre um beijo e outro de suas meninas
Ahhh... Minha puberdade...
Sem entender bem o que acontecia o tempo foi passando
Com 14 anos de idade perdi a virgindade no apartamento do cara
Verônica foi a dissoluta da boa ação sexual
Ela foi capa da revista Ele & Ela
Franja repicada
Calça Dijon com plaquinha de metal no bolso
Sandália de plástico
Outros tempos
Minha mãe é cristã ortodoxa e sofria por minha amizade com Demétrio
Eu não tive pai
Escolhi o mito como pai
Estar na vida dele
Passear em seus carros
Rezar pela caridade de outras maneiras
Rameiras
Denominação usada por Demétrio ao classificar suas meninas
Assim vivia a minha biografia
Daí pra drogas foi um pulo
Com 17 anos eu já tinha cheirado mais de 50gr de pó e comido 49 mulheres
Sim
Eu contei
Pior
Escrevi no meu diário
Na verdade, até outro dia.
Parei de anotar no número 1.000
Infantiloide
Tinha medo de passar de 1.000 bucetas
Pensava nos astros de rock
Comeram tanta gente
Enjoaram
Viraram viados
Começaram a dar ré no kibe
Cagar pra dentro
Tô fora
Hoje tenho 39 anos
Perdi a conta das piranhas picadas por mim
Passei a pica em geral
Eu não enjoei
Foi também aos 17 anos o meu primeiro trabalho pro grande homem
A missão:
Pegar uma BMW em Teresópolis e trazê-la pro Rio
Imaginem um menino de 17 anos, dirigindo uma BMW na Washington Luiz.
Esse menino era eu
Não abaixava minha cabeça pra nada
Na mala da BMW
Dentro do estepe
Um quilo de cocaína
Montinhos de dólares
Soube depois
Demétrio contou-me o que eu tinha feito
Deu-me os meus primeiros 1.000 dólares
Elementar meu caro
Outras mulas eu fiz
Não parei
O esquema era o seguinte
Alguém roubava um carro de luxo no Paraguai
Geralmente esportivos com preço superior a 100 mil
Botavam as drogas no estepe
Com novas placas eu os pegava em Foz do Iguaçu e trazia pro Rio
Outras vezes, levava pra São Paulo.
Abastecendo ambos os mercados de carros e de coca
Tudo era falsificado
Meu RG
CNH
CPF
A porra toda
Eu era outra pessoa
Só faltou-me um curso de espanhol
Nunca fui pego
A fé não costuma falhar
Eu já sabia
Em 1995
No dia do show do Rolling Stone
Maracanã
Soube do assassinato do Demétrio
Chorei como nunca
Era tarde
Eu já era o filho do bordel
O sem caráter
O coisa ruim
Tenho orgulho de mim
Demétrio igualmente teria
Herdei seu famoso Taco de Baseball e sua Doze Cano Cerrado
Minhas relíquias
Uma das suas biscates deu pra mim
Obrigada
Eu sou o putano
Hoje trabalho vendendo sonhos
O melhor emprego do mundo
Juntei dinheiro com os ensinamentos do meu guru e construí o Templo do Senhor
Depois outro
Outro
Hoje tenho um império
Virei pastor
Você me conhece
Sou o maior de todos
Tenho até programa na televisão
Quem foi que disse que o crime não compensa
Demétrio era otário comparado a nós, os exploradores da fé.
Doações não pagam impostos
Lavei meu dinheiro
Multipliquei minha grana
É melhor que vender armas e drogas
Tirar dindin dos idiotas da fé
É só pagar o dízimo
Eu abençoo logo
Sou o mensageiro de Deus
Minha mãe tem orgulho de mim
Acredite se quiser
Hoje eu trafico a palavra de Deus
Convertido porra nenhuma
Gosto de dinheiro
Sou o máximo
O putrafica divino
O filho do Satanás
Meu nome é Lúcifer Jr.


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Based on a work at http://www.pablotreuffar.com/.
A VERDADE É QUE EU MINTO

A VERDADE É QUE EU MINTO

13 comentários:

Paulo Laurindo disse...

Pablo, que filme!
Direto para as grandes antologias, a frase: "Não tive pai, escolhi o mito como pai". Adotei.

Pablo Treuffar disse...

Vlw Paulo

Glauber Vieira disse...

Gosto dessa forma de contar histórias; fiquei até curioso em saber quem foi o verdadeiro Demétrio. Muito bom.

Pablo Treuffar disse...

Vlw Glauber Vieira, o Demétrio vale a pena ser contado, abço!

Catiaho Reflexod'Alma disse...

Cara, sabe que adoro sua escrita.
Ela e mais que uma
simples narrativa
é
ex
ci
tan
te!
É melhor leitura pra seres
ávidos
como eu .
Adoro vc sempre.
Bjins entre sonhos e delírios

Unknown disse...

muito bem escrito

Unknown disse...

esse conto do traficante de deus é uma maravilha. pablo treuffar é disparado o mais cara de pau dos poetas sujos do rio de janeiro, sua escrita forte e sem papas na língua nos remete ao universo real do mundo de hoje, sua forma de escrever nos confunde. pablo treuffar escreve contos ou poesia? é prosa ou verso? como ele mesmo gosta de dizer em vários de suas coisas, vai saber. parabéns por mais uma composição apoteótica. a reflexão final entre quem é mais canalha é barbara.

Pablo Treuffar disse...

VLW
REFLEXO
MINEIRINHA
E NATALIA

Uila Gabriela disse...

Putz...Genial.
Devorei o teu blog numa madrugada meu chapa!
Meus parabéns!


Beijos

Uila Gabriela disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Pablo Treuffar disse...

vlw Uila Gabriela

Anônimo disse...

Sabe, poderia te dizer mil coisas pelo escrito, mas não dizer nada seria cruel. Nao saberas quem sou eu, mas sentiras as palavras que lhe são sincera parabéns.

Anônimo disse...

Sabe, poderia te dizer mil coisas pelo escrito, mas não dizer nada seria cruel. Nao saberas quem sou eu, mas sentiras as palavras que lhe são sincera parabéns.