Sexta-feira
O metrô estava estranhamente vazio naquela sexta-feira. Lá fora, o Rio de Janeiro continuava lindo. Mas para a minha alegria, a escuridão dos túneis deixava as pernas das cariocas ainda mais bonitas. Talvez fosse ilusão, quando havia poucas moças no metrô qualquer joelho valorizava a viagem. Na minha frente, uma bela prova da minha teoria: uma morena alta se espreguiçava calmamente, tinha seus dezessete anos. Tentei me lembrar dos meus dezessete, não consegui.
A menina olhou para mim. Meu peito, que já viveu alguns carnavais, se escolheu acuado. Meu nariz, por maior que seja, buscou sem sucesso o ar escasso do vagão. Engoli seco, ela iria falar.
A jovem sabia o que estava fazendo: com os pés apontados em minha direção, ela alisou seu cabelo e mordeu os lábios, o silêncio finalmente iria ser quebrado. Seus olhos passearam pelo ambiente, era como se pedissem autorização para o que ela iria fazer. Ela devagar abriu sua boca ... e logo depois a bolsa. O ar finalmente entrou nos meus pulmões, era alarme falso.
A moça tirou as mãos da bolsa e me encarou de novo. O suor mantinha minhas costas coladas no assento. Num gesto de angústia, arrisquei um sorriso. Sua boca se move novamente. Agora não tinha como, depois de quase me arrancar o marca-passo, ela tinha que falar.
Admito que não aguentei, olhei para o lado. Fingi ver as horas, mas os segundos não passavam .Quem diria, Capitão? Deu para ter medo de mulher bonita? A consciência não me perdoaria...o que que eu vou dizer lá em casa? Não vou dormir bem se não virar para frente e olhar bem ela. Tenho uma fama quase centenária na calçada, não seria uma moçinha bonita que iria me desestabilizar...já fiz esposa largar marido com apenas um telefona e meia dúzia de palavras.
Quando ia selecionar a melhor frase do meu arsenal, ela disparou:
-O senhor gostaria de comprar uma rifa?
-Rifa?!- perguntei incrédulo. Não podia ser, tanto charme para me oferecer um pedaço de papel?
- É, de uma bicicleta novinha. - Ela tentou justificar, tarde demais. Não fui o primeiro e nem serei o último homem feito que aquela senhorita decepcionou.
A Estação Inhaúma chegou,desembarquei ao som das minhas próprias gargalhadas. Essa cidade ainda me mata. Se não ela, uma carioca.
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Carlos Henrique Azevedo
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