quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

Desacordo




— Eu disse que precisávamos resolver isso.

Sorria ao repetir a frase, quando ela desligou o chuveiro e passou a enxugar os cabelos. Sabia que ficar ali parado encarando-a daquele jeito a incomodava, eram amigos há muito tempo. Tinha certeza que ela também não daria o braço a torcer. Divertia-se com sua teimosia silenciosa, andando nua pelo quarto, não se deixando vencer pela estranheza da situação. Gostava disso nela. Ainda enxugando os cabelos ela respondeu suavemente.

— Eu sei o que disse, mas agora o que eu preciso é ir embora.

A pressa, o rubor e os olhos tristes o irritavam mais do que gostaria de admitir. Era como se fosse agora outra mulher que tinha na sua frente.

— A pressa é sua não minha.

Passou a recolher as roupas espalhadas pelo quarto, os lábios dele se estreitaram numa linha fina.

— É eu sei que a pressa é minha.

Sabia que estava sendo sensata e até gostava disso, mas por alguma razão a sensatez dela naquele momento o irritava, sentia uma raiva crescente daquele ritual de despedida e fuga. Pegou sua saia sobre a cadeira num gesto rápido, ela sorriu e foi pegar alguma outra peça esquecida perto da cama, depois estendeu a mão pra que ele lhe desse a saia. Estava bonita assim semi-vestida, apressada e descalça. Ele sorriu e agarrou-a para um beijo rápido.

— Tudo bem. Vou ficar mais um pouco. Importa-se em sair sozinha?

Disse num tom neutro enquanto permitia que ela pegasse a saia.

— Fica tranqüilo. Prefiro assim.

Ajudou-a com o zíper, ela sorriu quando ele a beijou na curva do pescoço. Gostava do sorriso, era uma das coisas de que gostava nela, pois fazia um contraste interessante com os olhos tristes. Deitou na cama, braços sob a cabeça e ficou assistindo sua amiga se arrumar.

— Quando te vejo de novo?

— Não vê. Acho que resolvemos tudo que tínhamos pra resolver.

Prendeu os cabelos num coque, passou batom e passava os olhos pelo quarto em busca da bolsa, sapatos e da chave da porta.

— Não sei, acho que preciso resolver isso mais algumas vezes.

Ela sorriu. Estava quase pronta.

— Sei.

Procurava as sandálias.

— Sabe? Convencida.

Achou-as em algum lugar entre a cama e a porta.

— Não. Não sei. Te vejo quando quisermos, quando der ou não nos vemos. Não importa muito, não foi o que você disse? Queria apenas foder-me por horas.

— Foi o que eu disse ? Só não disse quantas horas.

Ela viu a chave na mão dele, olhou o relógio, ele sorriu.

2 comentários:

Ruy Villani disse...

Sabidamente gostado.

Paulo Braga disse...

Muito bom.... Reflete perfeitamente o pensar masculino. Perfeito retrato!