terça-feira, 23 de outubro de 2007

O 607 balança sob 35 graus

35 graus, sábado, duas e meia da tarde

O 607 balança, treme e pula no ritmo ditado por um asfalto deformado pelo sol carioca. O ônibus pára no ponto, a fila de pessoas que embarcam pára na roleta. O cobrador -um senhor negro, desdentado, cabelos grisalhos- dorme. Boca semi-aberta, corpo pendente, quase um bambu ao vento. Parece que está colado ao banco, caso contrário cairia. A primeira da fila, menina nova, fica sem ação: parece não saber se passa pela roleta ou espera o senhor despertar. Não tem coragem de acordá-lo, envergonha-se por ele. A fila a pressiona, as pessoas começam a reclamar. Um garoto de uns 15 anos toma a frente, mas também se detém em frente à roleta e o cobrador continua em seus sonhos. Por um momento, todos no ônibus olham para o pobre preto velho, torto, como que pedindo –em silêncio- que ele acorde. Finalmente o rapaz o cutuca na perna e, de muito longe, o cobrador volta ao ônibus da linha 607. Sorrindo sem graça, pedindo desculpas com o olhar, o velho recebe-o-dinheiro-dos-passageiros-faz-as-contas-devolve-o-troco, repetidamente, repetidamente, repetidamente... Quando o último passa, seus olhos se fecham e de forma extremamente rápida ele volta a dormir. 35 graus, sábado, duas horas e quarenta e um minutos da tarde. O 607 balança, treme e pula no ritmo ditado por um asfalto deformado pelo sol carioca. O cobrador, um senhor negro, desdentado, cabelos grisalhos, dorme. Boca semi-aberta, corpo pendente, quase um bambu ao vento. Parece que está colado ao banco, caso contrário cairia...

Um comentário:

Zéder disse...

Hey amigos,

estou na comunidade do bar do escritor.. como participo do blog além de ler? podem add meu link?
grande abraço!