O ORKUT DE BANHEIRO
Odiava profundamente aquele trabalho e tudo o que este lhe proporcionava: a dura missão de acordar antes dos galos mais pontuais, o salário minguado ao fim de um mês de largas contas, a rotina enfastiante de suas palavras diárias em forma de mantra: “- bom dia, senhor. -Boa tarde, senhor. -O que deseja, senhora? – Posso ajudá-la?”
Queria que todos fossem para o mais profundo inferno, toda aquela corja de institucionalizados que o cercava! Não nascera para aquilo, tinha a cruel certeza de que a escravidão já havia acabado, ou apenas,começado de uma maneira ainda mais sórdida, pois,sentia que recebia sua remuneração para fomentar o capital, num ciclo diabólico.
Foi com este pensamento mórbido que adentrou o halll do hotel mais caro da cidade, onde prestava seus inúteis serviços de mensageiro.
Mas, naquele dia, algo diferente acontecia em seu interior: uma profunda dor de barriga o desconcertava de seus planos sombrios de explodir o estabelecimento com uma bomba acoplada ao seu corpo.
Era forte demais, não dava para segurar. Correu para o banheiro de serviço, apertando as pernas para a merda não sair e contorcendo-se em cólicas.
Mal sentou-se no vaso imundo e despejou todo seu lixo interior naquela latrina que tanto evitava; jamais defecara ali, recusava-se a misturar sua bosta a dos demais serviçais.
Relaxou por um instante sua mente e deteve-se à porta do compartimento, que continha alguns rabiscos em letra de imprensa: “se você esta entediado, entre em contato comigo- sou gostosa e sei levar um homem à loucura. Deixe seu recado abaixo e entrarei em contato”.
Gostou da brincadeira, bobagens à parte, mas aquela criatura parecia desprendida e ousada, bem diferente daquelas bestas abissais, que se orgulhavam de contar quinze anos de casa exercendo a mesma função.
Respondeu à altura da conviva: “Quero conhecer-te, também sei levar uma mulher à loucura. Como você é?”
Ficou o resto do dia ansioso e preocupado, indo ao banheiro de dois em dois minutos. Chegou a achar que estava ficando perturbado, mas já fazia meses que se achava louco, então, isso não faria a menor diferença.
Entrementes, parecia que sua mensagem não havia sido recebida com sucesso e naquele dia não havia nenhuma resposta.
Foi embora cabisbaixo, pela primeira vez em dois anos, não vestiu a roupa ao avesso por conta da pressa em sair daquele ambiente inóspito.
Mas, ao contrário, ainda passou uma última olhadela pela porta de recados, sem encontrar nenhuma novidade.
Passou o resto do dia deitado no sofá confabulando a respeito de quem seria a musa do recado. Em sua mente, tratava-se de uma bela mulher disposta a amá-lo incondicionalmente. Refutava qualquer idéia contrária ao seu desejo.
No dia seguinte, chegou uma hora mais cedo que o horário, correu para o banheiro e sentou-se no vaso à procura de seus scraps e, lá estava, a mesma letra de outrora: - Olá, vejo que nos demos bem! Sou loura e tenho uma buceta molhadinha te esperando. E você como é? Fale-me apenas de seu pau! Beijos Nana.”
Ficou excitadíssimo, sentiu seu membro latejar dentro das calças ao imaginar uma funcionária gostosa, com uma buceta bem lambuzada para recebê-lo.
Respondeu à altura, enquanto olhava seu pênis crescer em suas mãos sedentas: “Meu pau é enorme, grosso e está bem rijo para recebê-la. O que você quer fazer com ele?”
Assim, masturbou-se vorazmente, enquanto imaginava a loura cavalgando seu cetro até fazê-lo gozar vorazmente.
Demorou exatamente uma hora e meia para sair do local e conseguiu bater o cartão atrasado, mesmo estando já no recinto de trabalho.
Passou o dia em eternas idas e vindas ao banheiro à procura de seus recados “calientes”, os colegas passaram a achar que um forte mal se abatera sobre o pobre.
Alguns especulavam a respeito de um possível câncer de próstata ou intestinal, que o obrigava a ir tantas vezes à “casa de banho”.
Mais uma vez, a sujeita só respondeu no dia seguinte: “Gostoso esse pau, como fez para secar a porra ontem? Imagina o que não farei com você ao vivo! Também toquei uma siririca pensando em seu caralho! Beijos, até amanhã. Nana”.
Agora sua rotina mudara, só pensava em como seria a tal Nana e em ir ao banheiro sempre que possível, o que lhe rendera um esporo do gerente: “Samuel, o que esta acontecendo? Se você esta com incontinência urinária ou renal, isto não é um problema nosso, tire férias ou coloque uma fralda geriátrica!”
Mas, a reclamação não foi o bastante para demover seu desejo de correspondência semi-virtual- os recados se seguiram semanas a fio, ao ponto dos correspondentes colocarem uma setinha indicando que o discurso continuava na porta seguinte e assim os dois encheram três portas distintas e algumas paredes.
Os dois travaram um relacionamento “virtual” sem medidas, ao ponto de evoluírem das juras de sexo selvagem às juras de amor eterno.
Mas, Samuel já não continha seu membro dentro das calças de tanta curiosidade e seu coração quieto dentro do peito de tanto amor. Já não via mais sua Nana somente como uma loura bela, mas também como uma criatura amável e meiga.
Não raro, os dois falavam sobre suas angustias e tristezas através das portas virtuais e consolavam-se mutuamente desta forma.
Foi assim, certos do possível amor e desejo que os unia, que a tal Nana aceitou marcar um encontro na suíte do hotel, com a condição de que seria a mais cara e de que ela mesma bancaria a conta.
E ainda, que tudo se realizaria na penumbra, na mais profunda penumbra.
Na noite combinada, encontraram-se na tal suíte presidencial, amaram-se desesperadamente, como se fossem antigos amantes separados pelo tempo e pela distância.
Pelas formas de seu corpo escultural, ela parecia ser de “parar o trânsito”. Seu cheiro floral era inconfundível e sua voz, um canto lírico medieval a retumbar pelos cantos do quarto.
Ele jamais imaginara que aquele local poderia lhe proporcionar tamanho prazer, bem como, nunca passara por sua torpe mente que um dia entraria ali para pernoitar no quarto mais caro.
Desta forma, seguiram-se todas as noites do porvir, numa entrega de corpos e descobertas jamais vista, seguindo-se aos recadinhos melosos nas portas dos banheiros a cada noite compartilhada.
Samuel não conseguia parar de imaginar aquela mulher tão encantadora, que ele aprendera a amar através do tato e das palavras.
Ele já não dividia mais seu tempo entre o banheiro e a casa, mas, agora vivia flanando pelo hall do hotel, como se voasse em lufadas de vento.
Foi assim, imerso em seus devaneios, que sentiu-se tomado pelo cheiro inconfundível de suas últimas noites. Seu corpo estremeceu, olhou para trás e viu uma loira maravilhosa, elegante e sensual descer as escadas.
Não teve dúvidas, era ela! Correu ao seu encontro para abraçá-la, mas foi detido pela voz do patrão: - Mensageiro, prepare o carro da Doutora Ana rápido, minha esposa, pois estamos atrasados, temos um vôo para a Bélgica.
Cambaleando, o preposto tirou o carro da patroa, abriu a porta para que ela entrasse, olhou-a mais uma vez, atônito com sua indiferença e balbuciou: -Vá com Deus, senhores.
Sentiu escorrer uma lágrima de seus olhos ao ver o carro partindo, quando leu o adesivo no vidro traseiro: VOTE EM NANA PARA VEREADORA. A MULHER DO POVO!
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